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Claudia Andujar: no lugar do outro


TEXTOS DA EXPOSIÇÃO

ABERTURA

CLAUDIA ANDUJAR, NO LUGAR DO OUTRO é fruto de dois anos de pesquisa no arquivo da fotógrafa. É também sua primeira grande exposição dedicada à produção que antecede o envolvimento de Claudia com os índios Yanomami, trabalho que começou a desenvolver nos anos 1970 e que a tornou conhecida mundialmente.

Claudia chegou a São Paulo em 1955, com 24 anos. Nascida na Suíça, viveu na Hungria até fugir com a mãe durante a Segunda Guerra Mundial. A família paterna, de origem judaica e húngara, foi morta nos campos de concentração de Dachau e Auschwitz, na Alemanha. Antes de desembarcar no Brasil, Claudia se refugiou na Suíça e viveu um período em Nova York. Os traumas da guerra, desentendimentos familiares e mudanças constantes fizeram com que ela se distanciasse de suas raízes e buscasse uma nova vida no Brasil. Sem domínio do português, logo descobriu na fotografia um instrumento de trabalho e de contato com o país.

Entre os anos 1950 e 1970, colaborou com revistas nacionais e estrangeiras, participou de exposições de arte e percorreu o Brasil de norte a sul. Em São Paulo, onde se estabeleceu, casou-se com o fotógrafo George Love, que conhecera nos Estados Unidos, e frequentou rodas que incluíam o antropólogo Darcy Ribeiro, o historiador Pietro Maria Bardi e o fotógrafo Marcel Gautherot. Foram anos de descobertas e produção intensa.

Com foco nas primeiras décadas de sua produção, esta mostra lança nova luz sobre a carreira da fotógrafa. Dividida em quatro grandes núcleos, a exposição apresenta as diferentes perspectivas com que Claudia explorou a fotografia e o país: a relação com a natureza, a imersão antropológica, as experimentações gráficas e o trabalho no fotojornalismo. Reportagens e ensaios pessoais mostram a amplitude de sua atuação, que se estende dos registros documentais em preto e branco do começo da carreira até a experimentação gráfica colorida da virada dos anos 1960 para os anos 1970.

Desde que chegou ao Brasil, Claudia se aventurou em realidades que desconhecia e se interessou por grupos fechados e marginalizados. Com uma visão humanista, ela usou a fotografia para entender o país que adotara e para descobrir a si própria. Durante toda a carreira, fez questão de se aproximar e se colocar no lugar do outro. Um deslocamento que também se deu no âmbito geográfico, quando foi obrigada a reconstruir a vida em um novo país.

Em 1971, Claudia entrou em contato com os índios Yanomami e transformou a documentação e a proteção desse povo em missão de vida, com contribuições inestimáveis ao país. Nos anos seguintes, a produção ligada aos índios se sobrepôs ao extenso trabalho das décadas anteriores − e boa parte dele ficou esquecida.

CLAUDIA ANDUJAR, NO LUGAR DO OUTRO destaca um período pouco visto e estudado de sua carreira. Com isso, ajuda a entender a originalidade e a complexidade da produção de uma das mais importantes fotógrafas brasileiras.

Curadoria Thyago Nogueira

SALA 1

Natureza, c. 1970-72

A primeira sala reúne fotografias feitas na região amazônica no começo da década de 1970, a maior parte delas ao longo do lavrado roraimense e do rio Jari, na divisa do Pará com o Amapá. Claudia visitou a cachoeira de Santo Antônio, no rio Jari, em 1972, época em que o interesse pela Amazônia era crescente, com a abertura de estradas, a instalação de fazendas de gado e o assentamento de trabalhadores de outros estados incentivados pelo governo militar (1964-1985). O primeiro contato da fotógrafa com a região ocorreu quando ela trabalhava para o número especial da revista Realidade dedicado à Amazônia, publicado em outubro de 1971.

Em meados dos anos 1960, Claudia havia começado a fotografar com filmes coloridos e iniciava uma fase de intensa experimentação. Nesse mesmo período,  conheceu o fotógrafo George Love, com quem se casou e construiu uma parceria profissional estreita, que culminou na obra-prima Amazônia, livro fotográfico publicado em 1978.

O encontro de Claudia com a natureza é arrebatador. A fotógrafa registra a paisagem com o uso de filtros, filmes infravermelhos e subexposição, resultando em uma visão que transcende o registro e oscila entre o sonho e a epifania. A beleza e a dramaticidade do conjunto, instalado aqui como uma floresta de imagens, não deixam de evocar a dimensão trágica. Parte desse ecossistema estava prestes a desaparecer, ameaçado pela construção de uma hidrelétrica no leito do rio Jari.

SALA 2/GABINETE

Famílias brasileiras, 1962-64

Este é um dos primeiros trabalhos de fôlego feitos por Claudia no Brasil, no começo dos anos 1960, poucos anos depois de dar início à sua produção fotográfica. Interessada em entender quem eram e como viviam os brasileiros, Claudia resolveu acompanhar o cotidiano de quatro famílias de contextos distintos: uma família dona de uma próspera fazenda de cacau na Bahia; uma família que morava em um bairro da classe média paulistana; uma família de pescadores caiçaras que vivia em Picinguaba, Ubatuba, no litoral norte de São Paulo; e uma família mineira, tradicional e religiosa.

Surpreende como Claudia conquistou a confiança de cada família, a ponto de mergulhar na intimidade e acompanhar as várias atividades cotidianas — a fotógrafa às vezes parece se tornar invisível. As centenas de fotos reunidas aqui como um grande álbum permitem acompanhar a dinâmica de cada família e contrastar os diferentes contextos sociais. Claudia não estava interessada em construir uma visão idealizada do brasileiro, mas em olhar, com um viés antropológico, para a experiência concreta e prosaica. O trabalho mostra o amadurecimento visual da jovem fotógrafa, que alterna entre o registro direto e imagens muito elaboradas, de múltiplos sentidos.

À época, Claudia almejava publicar o trabalho em uma revista, mas o perfil diverso do conjunto não interessou à publicação. A maior parte dessas imagens permaneceu inédita até hoje.

Família Paulista

Em maio de 1963, Claudia visitou a família Ranali, que morava no bairro do Jabaquara, em São Paulo, capital. Além das atividades corriqueiras, como as refeições e as sessões de TV, ela registrou a festa de 50 anos do chefe da família e os preparativos para o evento, como a ida ao mercado e ao cabeleireiro.

Família Mineira

Em 1964, Claudia passou cerca de duas semanas com a numerosa família Pereira de Meira, entre Diamantina e Congonhas do Campo, em Minas Gerais. O tempo em que estava com a família lhe deu intimidade para acompanhar a rotina do médico no consultório, o dia a dia das crianças, os passeios de fim de semana e as comemorações religiosas.

Família de Picinguaba

A vila de Picinguaba, hoje uma praia turística, era uma comunidade isolada do município de Ubatuba, no litoral norte de São Paulo, quando Claudia aportou por lá de barco, em novembro de 1963. A intimidade e a delicadeza com que fotografou a família de pescadores são admiráveis, mesmo em ambientes de pouca luz e conforto precário.

Família Baiana

Em março de 1962, Claudia esteve na fazenda Engenho D’Água, em São Francisco do Conde, na Bahia. As imagens da afluente família Porciúncula mostram a relação entre os membros da família e os empregados, os jantares na sede da fazenda e o trabalho na plantação de cacau e no canavial.

 

SALA 3

Cidade gráfica, c. 1970-74

No começo dos anos 1970, Claudia produziu em São Paulo estes quatro trabalhos, que têm como foco a cidade e seus habitantes. O período foi marcado por intensa experimentação visual e uma grande produção artística. Claudia mantinha contato com fotógrafos e editores de Nova York, e dividia seu tempo entre a atividade fotográfica e a de curadoria. Munida de filme infravermelho, ela sobrevoou São Paulo e sintetizou a densidade urbana no aglutinado de edifícios que parece cenário de um filme de ficção científica.

A rigidez e a compactação da cidade contrastam com a graciosa sinuosidade com que Claudia havia fotografado a modelo Sônia, por volta de 1971. Diante de um fundo infinito, Claudia registrou a modelo baiana que tentava a sorte em São Paulo. O ensaio durou três horas e consumiu dez rolos de filme, mas a fotógrafa não gostou do material e, pouco tempo depois, decidiu refotografar as imagens, sobrepondo-as e usando filtros. Publicada em junho daquele ano na Revista deFotografia, a série é uma espécie de radiografia do corpo feminino.

As nove fotos da Rua Direita foramrealizadas numa das regiões mais movimentadas do centro de São Paulo. Com a câmera quase encostada no chão, Claudia agiganta as pessoas e encolhe os edifícios, valorizando os transeuntes ao mesmo tempo que transforma a si mesma — e ao espectador — em assunto da imagem. O conjunto é exemplo da melhor tradição da fotografia de rua praticada nos Estados Unidos e pouco explorada no Brasil.

SALA 4 e 5

Histórias reais, 1966-71

Este núcleo reúne parte central da produção de Claudia, formada por reportagens e ensaios realizados para a revista Realidade, para a qual a fotógrafa trabalhou como freelancer de 1966 a 1971. Claudia colaborou com diversas publicações nacionais e estrangeiras, como as revistas LifeLookJubileeA CigarraClaudia, Setenta e Quatro Rodas. Mas foi com a revista Realidade, lançada emabril de1966, que a fotógrafa manteve a relação mais profunda e duradoura.

A produção ligada à Realidade foi inovadora por muitos motivos. A ousadia editorial, mesmo em plena ditadura militar, permitiu que Claudia mergulhasse em temas espinhosos, controversos ou pouco discutidos na imprensa, como as polêmicas cirurgias espirituais realizadas pelo médium ZÈ Arigó, em Congonhas do Campo (MG), a atividade de uma parteira na pequena Bento Gonçalves (RS) ou o cotidiano de homens homossexuais em São Paulo e no Rio. As mudanças nos costumes, os avanços da ciência e matérias de cunho político entravam no cardápio da revista. Na maior parte das vezes, Claudia realizava seu trabalho sem o acompanhamento dos repórteres, dispondo do tempo e da quantidade de filmes que julgasse necessários para construir sua história. A revista dava espaço generoso à fotografia, e oferecia liberdade para que a fotógrafa sugerisse pautas e construísse uma narrativa própria, que não funcionasse apenas como ilustração do conteúdo jornalístico. Realidade reuniu um time notável de fotógrafos, a maior parte deles de origem estrangeira, como a inglesa Maureen Bisilliat, o italiano Luigi Mamprin e os americanos George Love e David Drew Zingg.

Na primeira sala deste núcleo, estão reunidas três reportagens em preto e branco feitas para a revista. A empatia com os personagens, o uso de luz natural e a adoção do claro-escuro lembram o trabalho de fotógrafos americanos como W. Eugene Smith e Minor White — Claudia os conheceu em uma das visitas aos Estados Unidos.

Na sala seguinte, estão algumas das reportagens e ensaios que usam fotos em cores. Aos poucos, o preto e branco dramático dá lugar à experimentação cromática que marcou o período. O interesse por temas delicados, o comprometimento com seus assuntos, a sofisticação da narrativa e a sensibilidade com que se aproximou de realidades tão distintas fazem desses trabalhos de Claudia um dos pontos altos da fotografia brasileira.


“Homossexualismo”

“Na Idade Média, eles eram queimados vivos. Hoje são considerados criminosos em muitos países, marginalizados em todas as sociedades. Durante semanas, o jornalista Hamilton Almeida viveu o mundo triste e desumano dos homens que negam sua condição de homens.” (reportagem publicada em novembro de 1967)

Entre junho e setembro de 1967, Claudia fotografou a rotina de homossexuais em São Paulo e no Rio de Janeiro. As imagens de um casal em São Paulo foram encenadas na casa da fotógrafa, à maneira de uma fotonovela. No Rio, Claudia frequentou boates e pontos de encontros noturnos. É provável que tenha feito as fotos para a matéria sensacionalista que a revista veiculou em novembro sobre o assunto. Mas o artigo foi publicado sem imagens, o que sugere que o material tenha sido censurado.

“Nasceu!”

“A cidade de Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, vive no fundo de um vale cercada por montanhas cobertas de trigo, cevada e parreiras verde-brilhantes. O povo fala alto e os gestos acompanham as palavras — a colonização foi feita por imigrantes italianos. Depois que a indústria começou a substituir a agricultura, os hospitais foram surgindo e o progresso acabou com muitas tradições, uma delas a parteira que atendia a domicílio. Mas muita gente de Bento Gonçalves ainda não troca dona Odila pelo médico. Esta é a história de um de seus partos.” (reportagem publicada em janeiro de 1967, com texto de Narciso Kalili)

Claudia esteve em Bento Gonçalves em dezembro de 1966 para fotografar a rotina de dona Odila, em uma matéria que contrapunha os costumes tradicionais aos avanços da medicina. A reportagem acompanha um parto natural em casa e ficou famosa por publicar a foto de uma mulher dando à luz, o que fez com que a edição da revista fosse apreendida.

“Arigó é a última esperança”

“Alguns o consideram um impostor. Estudiosos tentam explicá-lo cientificamente. Religiosos dizem apenas: é a fé que o faz curar. Para os que já foram a Congonhas do Campo, Minas Gerais, tratar-se com ele, e para os que acreditam em seu poder de curar, Arigó é a última esperança.” (reportagem publicada em junho de 1967, com texto de Roberto Freire)

Em março de 1967, Claudia viajou a Congonhas do Campo, Minas Gerais, para acompanhar as atividades de José Pedro de Freitas, conhecido como Zé Arigó. Gente de todo o país e de nações vizinhas acorria ao médium-curandeiro para tratar males diversos, em consultas que não chegavam a durar 60 segundos. Sem formação médica, Arigó ganhou as manchetes com as cirurgias em que enfiava uma faca entre a pálpebra e o globo ocular do paciente, procedimento registrado por Claudia de maneira cinematográfica.


“Ele é um viciado”

“Esta reportagem é uma grave advertência: mais de 100 mil brasileiros — a maioria jovens de 16 a 30 anos — tomam drogas, são viciados. À margem da sociedade, estes homens e mulheres desajustados fogem da realidade e encontram alguns momentos de prazer a troco de sofrimentos incalculáveis.” (reportagem publicada em maio de 1967, com texto de Narciso Kalili)

Claudia e o repórter acompanharam uma experiência real de uso de drogas, num exemplo de ousadia editorial até mesmo para os padrões atuais. Com a supervisão de um policial do Setor de Entorpecentes do Departamento de Investigações de São Paulo, a matéria narra a chegada da droga num apartamento e o passo a passo do usuário. A revista publicou algumas imagens em preto e branco. Insatisfeita com o resultado, Claudia deu ares lisérgicos às imagens com um novo tratamento gráfico.

“É a loucura”

“A sociedade não a compreende nem aceita. Prefere vê-la marginalizada nos hospitais e fechada em seu mundo de sombras e medo.” (reportagem publicada em junho de 1968, com texto de Norma Freire)

As imagens mostram o isolamento e o abandono em que viviam os pacientes do Hospital Psiquiátrico do Juqueri, então o principal estabelecimento de tratamento de doentes mentais no estado de São Paulo. É provável que Claudia tenha feito as fotos em 1963, anos antes da publicação da matéria.

“É o trem do diabo”

“A bagagem com que chegaram a São Paulo era feita de esperanças. Uns buscavam emprego, outros procuravam parentes engolidos pela cidade grande, outros sonhavam recuperar a saúde perdida. Todos queriam aquilo que para muitos não passou de desejo: uma vida melhor. E chegou a hora da volta para o interior: um lugarejo qualquer de Minas, uma cidadezinha no sertão da Bahia. Com uma trouxa de roupa e um passe de favor, embarcam nos vagões de madeira vermelha do ‘trem baiano’. Criaturas maltratadas pelo destino, retornam já sem esperanças. A viagem é longa, sofrida.” (reportagem publicada em maio de 1969, com texto de Patricio Renato)

Entre fevereiro e março de 1969, Claudia embarcou sozinha na longa viagem de
trem que ligava a estação Roosevelt (hoje, Brás), em São Paulo, a Salvador, na Bahia.
A viagem durava 7 dias, e a maioria dos passageiros era composta de migrantes de outros estados que haviam tentado a sorte em São Paulo. Sem perspectivas na capital, iam parar no Departamento de Imigração e Colonização da Secretaria da Agricultura de São Paulo, que lhes dava um farnel e uma passagem de volta para casa. Claudia encarou a viagem extenuante e registrou os passageiros com uma empatia admirável.

“Eles procuram a paz”

“Aqui, os personagens agridem e são agredidos, todas as máscaras caem, num duro jogo da verdade. É uma sessão de psicodrama, uma técnica de tratamento psiquiátrico em que, orientados por dois terapeutas, os pacientes se libertam da angústia, representando num palco as situações de crise de suas próprias vidas.” (reportagem publicada em janeiro de 1970 com texto de Jorge Andrade)

“O pesadelo”

“Cientistas americanos fizeram fantásticas descobertas sobre um fenômeno que aterroriza o homem há milênios e que, até hoje, era classificado simplesmente como ‘um sonho mau’. Agora já se sabe o que é a mais terrível experiência psíquica que alguém pode viver: o pesadelo.” (reportagem publicada em fevereiro de 1970, com texto de Edwin Diamond)

Para ilustrar a matéria sobre os avanços da ciência no campo psíquico, Claudia fotografou uma boneca, sua gata Pipi e outros pertences, e manipulou as imagens, sobrepondo fotos e aplicando filtros.

 

CRONOLOGIA

Ângelo Manjabosco e Thyago Nogueira

1931

Claudine Haas nasce em Neuchâtel, Suíça, em 12 de junho, filha única de Germaine Guye e Siegfried Haas. A família volta a morar em Oradea (Nagyvárad, em húngaro), cidade romena que pertencera à Hungria até o final da Primeira Guerra Mundial. É lá que vive a família paterna, de raízes judaico--húngaras. A família materna é de origem protestante suíça. Quando Claudine tem cerca de nove anos, os pais se separam. Em 1940, Oradea volta a fazer parte da Hungria.

1944-45

O pai e outros membros da família paterna são enviados aos campos de concentração de Auschwitz e Dachau, no sul da Polônia
e da Alemanha, respectivamente. Todos são mortos. Claudine e a mãe fogem para a Suíça.

1946

A jovem deixa a mãe para morar em Nova York, com o tio Marczel Haas. Nos Estados Unidos, muda o nome para Claudia.

1949

Casa-se com o espanhol Julio Andujar, amigo de ginásio. De 1949 a 1952, estuda no Hunter College, que integra a Universidade da Cidade de Nova York.

1950

Julio Andujar se alista no exército norte-americano e vai lutar na Guerra da Coreia (1950-53). Quando ele volta, em 1953, o casal se separa e, mais tarde, se divorcia. Andujar decide manter o sobrenome do marido para esconder a origem judaica. Começa a pintar, inspirada pelo expressionismo abstrato. Trabalha dois anos como guia turístico na sede das Nações Unidas.

1952

Participa, com óleos, de uma exposição com o pintor e cineasta filipino Ramon Estella na Galeria Coeval, em Nova York. Expõe seus quadros nas Nações Unidas.

1955

Deixa Nova York para reencontrar a mãe no Brasil. Desembarca em Santos em 9 de junho e segue para São Paulo, onde estabelece residência e vive até hoje. A mãe se mudara para o Brasil para se casar com um imigrante romeno que conhecera na Hungria. Andujar começa a se interessar por fotografia.

1956-57

Viaja pelo litoral paulista e pela América Latina – Bolívia, Peru, Argentina e Chile. Faz duas visitas aos índios Karajá, na ilha do Bananal, no rio Araguaia. “Foi meu primeiro projeto self-assigned, com a permissão do Serviço de Proteção aos Índios.”

1958

Publica na revista A Cigarra os artigos
“A menina e o tempo” (agosto) e “O santuário entre pedras” (setembro). É convidada por Pietro Maria Bardi, diretor do Museu de Arte de São Paulo (Masp), a realizar um grande vitral da Floresta Amazônica no teto do hall de entrada da Fundação Armando Alvares Penteado, em São Paulo. Bardi escreve sobre as pinturas de Andujar para a revista Habitat.

1959

Fotografa na Espanha, na Itália e na França, visita os Estados Unidos. O Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) adquire duas fotografias suas, exibidas na mostra Fotografias para colecionadores (Photographs for Collectors, 1960), ao lado de trabalhos de Henri Cartier-Bresson, Ansel Adams e outros.

1960

Passa janeiro e fevereiro entre os índios Karajá. Em julho, viaja a Nova York. Em outubro, a edição em espanhol da revista Life publica um ensaio com fotografias dos Karajá, com o título “Uma tribo esquecida”. A galeria Limelight, de Nova York, organiza a primeira exposição individual de Andujar, com curadoria do fotógrafo norte-americano Lew Parrella. Andujar trabalha como freelancer para a revista norte-americana Jubilee, em reportagens como “Russos no Brasil” (“Russian in Brazil”, janeiro), “Semana Santa em Sevilha” (“Holy Week Seville”, abril) e “Esperança para as favelas” (“Hope for the Favelas”, novembro).

1961

Expõe na George Eastman House de Rochester. De volta ao Brasil, realiza para a rede de televisão norte-americana ABC o documentário Um sorriso, uma cidade, uma canção (A Smile, a City and a Song), sobre as atividades de dom Helder Camara nas favelas cariocas. Nos anos seguintes, atua como fotógrafa freelancer para revistas norte-americanas e brasileiras, como LifeLook e Claudia. O ensaio “O povo do Rio” (“The People of Rio”) é capa da revista Look em junho de 1963.

1962-64

Desenvolve a série das Famílias brasileiras. O ensaio é oferecido à revista Claudia, que não o publica por não se encaixar na linha editorial. Em 1964, participa da exposição coletiva O homem e seu mundo (Weltausstellung der Photographie), organizada pelo fotógrafo alemão Karl Pawek e exibida em museus europeus. Também inicia dois projetos: o primeiro, inacabado, sobre a cidade de Igaratá, no vale do Paraíba, em São Paulo, ameaçada pela construção de uma barragem; o segundo, sobre a etnia Bororo, localizada no Mato Grosso. Este último será concluído em 1965, após uma segunda visita. “Documentei especificamente a mulher Bororo, como símbolo da continuação da vida de um povo. Com um portfólio com mais de 40 dessas fotografias, fui aos Estados Unidos. E a revista Modern Photography publicou um ensaio sobre o mesmo trabalho.”

1965

Permanece em Nova York de junho a setembro. A exposição coletiva O mundo e seu povo (The World and Its People), com fotos suas, é exibida no pavilhão da Kodak na Feira Mundial de Nova York. Faz contato com a agência de fotografia Rapho Guillumette e conhece o fotógrafo George Love, com quem se casará oficialmente em 1968. Love integrava a Associação dos Heliógrafos (destacado grupo de fotógrafos da costa leste dos Estados Unidos), da qual Andujar passará a fazer parte.

1966

A edição de março da revista americana Jubilee publica imagens da família mineira.Começa a colaborar com a revista Realidade (Editora Abril), que também acolheu George Love, David Drew Zingg, Luigi Mamprin, Lew Parrella, Maureen Bisilliat, Roger Bester, Jorge Bodanzky, entre outros. Até 1971, quando encerra sua colaboração, terá realizado mais de 30 reportagens para a publicação.

1967

A edição de janeiro da Realidade é apreendida em razão de uma foto de Andujar que mostra uma mulher dando à luz.

1968

Com Love, produz filmes publicitários em table-top sobre a Colômbia, o Chile, a Argentina e os Estados Unidos.

1970

Publica o livro Uma semana no mundo de Bico (A Week in Bico’s World), por encomenda da editora norte-americana Collier Macmillan. Bico é filho do fotógrafo Otto Stupakoff. Em outubro, publica na revista Setenta um ensaio de moda feito no Alto Xingu. Em novembro, participa da mostra Fotógrafos de São Paulo, no Museu de Arte Brasileira (MAB Faap), com Love, Bisilliat e outros.

1971

O Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP exibe 9 fotógrafos de São Paulo, com parte dos trabalhos da mostra realizada meses antes pelo Museu de Arte Brasileira. Andujar exibe a projeção A Sônia no Masp, acompanhada da música “I Had a Dream”, de John Sebastian. Em junho, publica o ensaio no primeiro número da Revista de Fotografia, que tinha Love como editor fotográfico. Com este, começa a trabalhar como editora de fotografia da revista O Bondinho. Ambas as revistas eram editadas pela Arte & Comunicação, grupo editorial formado por jornalistas oriundos da Realidade. Love, Andujar e Bisilliat organizam no Masp a exposição A família brasileira, com acervos fotográficos de famílias do estado de São Paulo. Enquanto trabalha na edição especial da revista Realidadededicada à Amazônia, entra em contato com a etnia Yanomami, em Roraima. Por dois anos seguidos recebe bolsa da Fundação John Simon Guggenheim. “Com o rápido ritmo de aculturação dos índios devido aos projetos de estradas e de aproveitamento da Bacia amazônica que fazem parte dos planos do governo brasileiro, penso em registrar para o futuro a vida de um grupo étnico que pode ser atingido por esses planos de penetração e integração.”

1972

Viaja pelo rio Jari, que divide os estados do Pará e do Amapá, e faz as fotos da série Natureza.  Propõe ao MAC USP a exposição
O fotógrafo desconhecido, com obras enviadas por fotógrafos de todo o país. A mostra, realizada em novembro, contou com Andujar, Love, Bisilliat e Djalma Batista na comissão julgadora.

1973

Andujar e George Love participam da exposição Hileia Amazônica, no Masp.

 

1974

Separa-se do fotógrafo George Love.

1976

Naturaliza-se brasileira. Organiza no Masp a exposição Grande São Paulo, com a colaboração do fotógrafo Cristiano Mascaro. A exposição inclui imagens de 98 fotógrafos brasileiros numa instalação no primeiro subsolo do museu. Recebe bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para fotografar os Yanomami, em Roraima, onde se estabelece até o ano seguinte, quando é enquadrada na Lei de Segurança Nacional e a Funai a expulsa.

1978-80

Lança o livro Amazônia (Praxis, 1978), em parceria com Love. Com o italiano Carlo Zacquini, encarregado da saúde dos Yanomami na Missão Catrimani, incentiva os índios a desenhar pela primeira vez sobre papel para registrar o modo de vida e o pensamento mitológico do grupo. Em 1979, a Olivetti do Brasil publica o livro Mitopoemas Yãnomam.

1978

Torna-se membro fundadora da Comissão pela Criação do Parque Yanomami (CCPY), hoje chamada Comissão Pró-Yanomami, que luta pelo reconhecimento da terra Yanomami. Coordena os trabalhos da CCPY.

1980

Suas fotografias ilustram o livro Missa da terra sem males (Tempo 27/Presença, 1980), com poemas de dom Pedro Casaldáliga. Começa a coordenar a campanha pela demarcação das terras dos Yanomami.

1981-83

Realiza as fotografias de identificação da população Yanomami que mais tarde se transformariam na série Marcados (2006).

1989

Exibe no Masp o audiovisual Genocídio Yanomami.

1991-92

A exposição Yanomami (1991) é apresentada no Memorial da América Latina, em São Paulo. No ano seguinte, o governo federal reconhece e demarca as terras Yanomami.

1998

A XXIV Bienal de Arte de São Paulo apresenta a instalação Na sombra das luzes, composta de 21 imagens sobre os Yanomami. A obra será exposta novamente em 2000, no Museu da Imagem e do Som (MIS), em São Paulo.

1999-2000

Fotos de Andujar são exibidas no festival PhotoEspaña, em Madri. No ano seguinte,
o escritor Eduardo Galeano lhe entrega o Prêmio Anual pela Liberdade Cultural da Fundação Lannan, sediada no Novo México.

2001-15

Em 2003, a Revista da Folha publica um reencontro de Andujar com a família paulista fotografada em 1963 para a série Famílias brasileiras. Em 2004, recebe a Bolsa Vitae de Artes, com a qual começa a retrabalhar seu acervo. Participa de inúmeras exposições coletivas e individuais, com destaque para A vulnerabilidade do ser (Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2005) e Yanomami (Fundação Cartier de Paris, 2002).