Herói na vida e na ficção
27 DE STEMBRO DE 2021 | EQUIPE IMS
Um dos principais líderes da resistência argelina contra a ocupação francesa em seu país nos anos 1950, Saadi Yacef extrapolou a figura de herói real para se tornar um protagonista revolucionário na ficção. Convidado pelo diretor italiano Gillo Pontecorvo, ele representou a si mesmo no filme A batalha de Argel, lançado em 1966, que retrata aqueles dias de luta. Yacef morreu em 10/9, aos 93 anos, na capital argelina, mas seus ideais libertários estão vividamente retratados no longa vencedor do Leão de Ouro em Veneza e com três indicações ao Oscar, lançado em DVD pelo Instituto Moreira Salles, em 2014. Disponível na loja do IMS, o DVD traz um depoimento de Yacef Saadi a José Carlos Avellar, gravado em 2005, e o livreto “A verdade 24 vezes por segundo”, com análise crítica de Avellar.
Yacef se envolveu com movimentos da oposição ainda adolescente e, em 1954, aos 26 anos, juntou-se à Frente de Libertação Nacional (FLN), a mais importante organização na guerra pela independência da Argélia, na qual chegou a chefe militar em Argel. Não é uma posição da qual se sai impune num confronto como aquele: Yacef ordenou vários ataques a bomba e em 1957 foi capturado por paraquedistas franceses, preso e condenado à morte.
Beneficiado com um indulto, foi transferido para uma prisão francesa, onde escreveu um livro de memórias, Souvenirs de la Bataille d’Alger (Lembranças da batalha de Argel). Yacef foi libertado em 1962, com o fim do conflito e a independência da Argélia, e, fã do neorrealismo italiano, rumou para a Itália, em busca de um diretor e de um roteirista capazes de traduzir seu livro em linguagem cinematográfica: Gillo Pontecorvo, o realizador de Kapò, que se passa em um campo de concentração na Segunda Guerra Mundial, e Franco Solinas, autor do roteiro de O bandido Giuliano, sobre o herói do movimento separatista da Sicília Salvatore Giuliano.
Por sugestão de Pontecorvo, A batalha de Argel é um filme quase documental, sem maniqueísmos – nele, em que Yacef, além de ator, também é produtor, ataques da FLN a civis inocentes e sessões de tortura levadas a cabo por militares franceses são igualmente retratados. A riqueza das descrições de eventos decisivos da guerra pela independência é tema de um texto do jornalista e documentarista Luiz Alberto Sanz, publicado em 2014 no Blog do IMS. Nele, Sanz disseca o clássico momento a momento.
Em 2004, o Festival do Rio promoveu uma sessão de gala, no Espaço Unibanco, para exibir a cópia restaurada, que já passara por Cannes, Montreal e Londres. Yacef, àquela altura senador em seu país, apresentou a sessão, emocionando a plateia que lotava o cinema e sendo longamente aplaudido. Em entrevista à Folha de S. Paulo, ele disse:
"Nós tentamos a liberdade por meios pacíficos. Mas os franceses não concordaram. Eles não tiraram lições das outras experiências colonialistas. Para conseguir a independência do país, tivemos que pagar um preço, fazer o sacrifício necessário. Foi uma época de extrema violência".
Na mesma ocasião, falando ao Globo, comentou:
"Não esperava que o filme fosse ter um sucesso comercial tão grande. Ele demonstra que todos os exércitos podem se unir para destruir um povo, mas a ideia de resistência é mais forte. O mais importante é que a minha figura não está à frente, e sim o povo, a quem pertence a História."
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