A Sessão Mutual Films de abril de 2025 apresenta dois programas de filmes que tratam da luta de homens e mulheres comuns para se adequarem a sistemas degradantes e desumanos, em prol de uma futura sociedade mais justa. O protagonista da ficção independente norte-americana Nada além de um homem (1964), Duff Anderson, trabalha na construção de uma ferrovia no Sul dos Estados Unidos. Ele é um homem negro que enfrenta diariamente a violência do racismo no Alabama e, assim como seus colegas, vive com amargura e descrença, até conhecer Josie Dawson, uma professora do ensino fundamental e filha do principal pastor local, que mostra a ele um outro caminho. Um dos filmes favoritos de Malcolm X foi feito em parceria entre o cinegrafista Robert M. Young (1924-2024) e o diretor Michael Roemer (nascido em 1928), um imigrante judeu que utilizou suas memórias da Alemanha nazista para retratar a violência de um Estado capitalista segregado. Já no docudrama A vida de um minerador exemplar (1972) – uma obra maestral do movimento Black Wave (Onda Negra) iugoslavo –, o diretor bósnio Bahrudin “Bato” Čengić (1931-2007) e o cinegrafista esloveno-macedônio Karpo Godina (nascido em 1943) buscaram recriar a história de vida do celebrado minerador Alija Sirotanović, com trabalhadores rurais reais na Bósnia. Eles registram os homens e suas famílias em uma série de planos fixos, que comentam tanto as ferramentas de propaganda em um Estado comunista, que transformou o trabalho dos mineradores em um jogo competitivo entre cidadãos de diferentes regiões da Iugoslávia, quanto a tragédia de uma geração de heróis cuja memória foi descartada pela sociedade em geral. As exibições de A vida de um minerador exemplar também contarão com um curto documentário musical dirigido por Godina sobre a coexistência de diversas comunidades em uma região rural da Sérvia, chamado Gente saudável para brincar (1971). Os filmes passarão no IMS Paulista em novas cópias digitais recém-restauradas.
A curadoria e produção da Sessão Mutual Films são de Aaron Cutler e Mariana Shellard.
Sessões especiais
IMS PAULISTA
Nada além de um homem
16/4/25, quarta, 18h
Sessão apresentada por Mariana Shellard e Aaron Cutler
Gente saudável para brincar + A vida de um minerador exemplar
16/4/25, quarta, 20h
Sessão apresentada por Mariana Shellard e Aaron Cutler

Filmes
Nada além de um homem
Nothing But a Man
Michael Roemer | EUA | 1964, 92’, DCP, restauração 4K (The Film Desk) | Classificação indicativa: 14 anos
Nada além de um homem conta a história de Duff Anderson (interpretado pelo ator e ativista político Ivan Dixon), um homem negro de 30 e poucos anos que trabalha na empresa ferroviária no estado segregado do Alabama, no Sul dos Estados Unidos. Uma noite, numa festa religiosa, ele conhece Josie Dawson (a cantora de jazz e também ativista Abbey Lincoln), uma professora do ensino básico e filha do proeminente pastor negro local. O estilo de Duff – ácido, casual, muitas vezes taciturno e resistente à integração numa sociedade liderada por brancos – atrai Josie para fora do seu ambiente familiar conservador, imponente e restritivo. Os dois se apaixonam e decidem se casar, a contragosto de todos ao seu redor. Duff então enfrenta uma série de desafios ao tentar sustentar sua nova família e sobreviver enquanto pai e marido.
O filme norte-americano foi coproduzido de forma independente e corroteirizado pelo cinegrafista Robert M. Young e o diretor Michael Roemer, ex-colegas de faculdade na Universidade de Harvard, que já haviam colaborado em um documentário. O nova-iorquino Young e o berlinense Roemer conceberam Nada além de um homem no auge do movimento dos direitos civis nos Estados Unidos e ao longo de uma viagem de pesquisa pelo Sul do país. A obra resultante (que foi filmada em uma comunidade negra numa parte sulista de Nova Jersey por motivos de segurança) foi marcada por uma forte verossimilhança emocional. A fotografia compassiva de Young registrou close-ups de seus protagonistas, com uma aproximação emocional considerada radical para o cinema norte-americano da época. Roemer baseou-se nas suas próprias memórias de criança judia na Alemanha nazista para delinear tanto a ira animalesca dos racistas brancos que cerceiam Duff e Josie quanto as dinâmicas de uma família em risco de se desintegrar sob o peso da opressão social.
Nada além de um homem foi inovador em seu uso da trilha sonora, que contou com participações de artistas da Motown, como The Miracles, Mary Wells e o então adolescente Stevie Wonder. O filme foi lançado um ano antes do assassinato de Malcolm X, que valorizou seu retrato da busca por uma autossuficiência negra norte-americana. Ganhou dois prêmios no Festival Internacional de Cinema de Veneza e elogios quando passou no Festival de Cinema de Nova York, porém foi lançado nos Estados Unidos de forma tímida e acabou passando majoritariamente em centros comunitários e universidades. O longa foi relançado com êxito em 1993 e, nas décadas seguintes, se tornou uma referência para diversos artistas, entre eles a cineasta francesa de descendência senegalesa Alice Diop (Saint Omer), que comentou em uma entrevista recente que o filme “magnifico” de Roemer e Young “lida com a condição dos afro-americanos de uma maneira inédita pra mim, por ser tão preciso e baseado na observação da comunidade, de forma totalmente ficcional.” 1
O filme foi restaurado em película pela Biblioteca de Congresso em 2013 e, em 2024, remasterizado em 4K a partir dos seus negativos originais de câmera (hoje localizados na George Eastman House, em Nova York). A remasterização foi feita em parceria entre o selo The Criterion Collection e a distribuidora The Film Desk, responsável pela circulação em novas cópias da filmografia enxuta de Roemer. As exibições de Nada além de um homem no IMS Paulista marcam a estreia da versão digital do filme no Brasil.
PROGRAMAÇÃO
IMS Paulista
16/4/25, quarta, 18h
Sessão apresentada por Mariana Shellard e Aaron Cutler
27/4/2025, domingo, 18h
Classificação indicativa da sessão: 14 anos
Adem (interpretado por Adem Čejvan) é um minerador que vive em uma parte rural da Bósnia logo após a conclusão da Segunda Guerra Mundial. No filme pitoresco A vida de um minerador exemplar, acompanhamos as aventuras do udarnik (trabalhador e herói nacional) e seus colegas enquanto competem diretamente com outros mineradores de regiões iugoslavas para ganhar medalhas oficiais. No decorrer dos 25 anos da história, Adem perde sua segunda mulher (Helena Buljan) para a família tradicional muçulmana dela, ganha uma condecorada mineradora como sua terceira esposa (Štefka Drolc) e acaba sozinho e em busca de ajuda para cuidar das suas seis filhas. Ele também vai de um seguidor do exemplo do minerador soviético Alexei Stakhanov para um homem fisicamente destruído, que faz de tudo para se manter ao lado dos seus companheiros, sem perder as suas crenças em nenhum momento.
A vida de um minerador exemplar foi inspirado na história do udarnik mais celebrado da ex-Iugoslávia, o bósnio Alija Sirotanović, que aparece no filme como uma versão dele mesmo e no meio de um elenco de atores profissionais e não profissionais (vários deles mineradores reais cujos feitos foram esquecidos na memória nacional popular). O terceiro longa-metragem do cineasta bósnio Bahrudin “Bato” Čengić foi feito em parceria com o cinegrafista esloveno-macedônio Karpo Godina, que inventou maneiras de iluminar as cenas nas minas subterrâneas de carvão a 600 metros da superfície. O filme é estruturado como uma série de cenas realizadas no estilo tableau vivant (pintura viva), com um efeito tragicômico que imita um estilo clássico de propaganda socialista e, ao mesmo tempo, revela a vulnerabilidade humana por trás dela.
A vida de um minerador exemplar estreou no Festival de Cinema de Pula, na Croácia, onde muitos espectadores desafiaram a autenticidade da representação da condição dos seus personagens. Porém, apesar da sua recepção inicialmente hostil, o filme foi reconhecido ao longo dos anos como uma contribuição crucial ao movimento cinematográfico da Black Wave (Onda Negra) iugoslava, cujos filmes buscaram representar a realidade iugoslava de forma crítica e criativa. Ele foi restaurado digitalmente em 2023, sob a supervisão do ainda ativo Godina, em um projeto realizado em parceria entre a Cinemateca da Eslovênia, a Cinemateca da Croácia, o Centro de Cinema de Sarajevo e o Museu de Cinema da Áustria, e que contou com o apoio de um prêmio dado pela Associação das Cinematecas Europeias (ACE). A restauração em 4K estreou no Festival de Cinema de Veneza, meio século após as primeiras exibições de A vida de um minerador exemplar no mesmo evento.
O programa no IMS Paulista também conta com um curta-metragem dirigido por Godina que ajudou a inspirar a estética do longa de Čengić. Gente saudável para brincar é um documentário musical e colorido, filmado na província de Voivodina, no norte da Sérvia, uma região conhecida pela grande quantidade de etnias e línguas entre sua população. A câmera de Godina faz um panorama dos diversos habitantes da província, cujos depoimentos sobre suas vidas são muitas vezes filmados em frente de suas casas. Gente saudável para brincar ganhou dois prêmios no Festival Internacional de Curtas-Metragens de Oberhausen em 1971 e, em 2016, foi restaurado digitalmente pela Cinemateca da Eslovênia em parceria com o Museu de Cinema da Áustria (entre outras entidades), em um projeto dedicado à restauração digital da produção de Godina como curta-metragista experimental. Agradecimentos especiais pelas primeiras exibições brasileiras da versão restaurada do filme vão para Dara Hlavka Godina e Karpo Ačimović Godina.
O programa conta com os filmes:
Gente saudável para brincar
Zdravi ljudi za razonadu
Karpo Ačimović Godina | Iugoslávia | 1971, 16’, DCP, cópia restaurada (Cinemateca da Eslovénia) | Classificação indicativa: 14 anos
A vida de um minerador exemplar
Slike iz života udarnika
Bahrudin “Bato” Čengić | Iugoslávia | 1972, 79’, DCP, restauração 4K (Centro de Cinema de Sarajevo) | Classificação indicativa: 14 anos
PROGRAMAÇÃO
IMS Paulista
16/4/25, quarta, 20h
Sessão apresentada por Mariana Shellard e Aaron Cutler
27/4/2025, domingo, 16h
Apoio:
IMS PAULISTA
16/4/25, quarta
18h - Nada além de um homem
20h - Gente saudável para brincar + A vida de um minerador exemplar
Sessões apresentadas por Mariana Shellard e Aaron Cutler
27/4/2025, domingo
16h - Gente saudável para brincar + A vida de um minerador exemplar
18h - Nada além de um homem
Vendas
Os ingressos do cinema podem ser adquiridos online ou na bilheteria do centro cultural, mais informações abaixo.
Meia-entrada
Com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública, estudantes, crianças de 3 a 12 anos, pessoas com deficiência, portadores de Identidade Jovem e maiores de 60 anos.
Cliente Itaú
Desconto de 50% para o titular ao comprar o ingresso com o cartão Itaú (crédito ou débito). Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala.
Devolução de ingressos
Em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos e por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site.
IMS Paulista
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Bilheteria: de terça a domingo, das 12h até o início da última sessão de cinema do dia, na Praça, no 5º andar.
Os ingressos para as sessões são vendidos na recepção do IMS Paulista e pelo site ingresso.com. A venda é mensal e os ingressos são liberados no primeiro dia de cada mês.