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Carlinhos Oliveira estreia no Portal da Crônica

24 de novembro DE 2020 |
Carlinhos Oliveira, cujas crônicas começam a ser publicadas em 30 de novembro. Foto: Sebastião Barbosa

 

Poucos cronistas captaram a alma carioca como José Carlos Oliveira. Representante exemplar da intelectualidade e da boemia (com ênfase nesta segunda) da Zona Sul do Rio, Carlinhos Oliveira, como era conhecido, encantou os leitores do Jornal do Brasil durante 23 anos, com os textos que publicava quatro vezes por semana, entre 1961 e 1984, perfazendo mais de 3 mil crônicas. Agora, parte delas poderá ser lida no Portal da Crônica Brasileira, site do IMS que preserva a memória desse gênero literário. A primeira, A árvore de ouro, estará disponível no dia 30 de novembro, e mostra uma faceta lírica do escritor: um flamboyant em flor, entrevisto entre duas paredes de concreto de prédios de Copacabana, transforma o estado de ânimo do narrador que vislumbra a árvore, afastando a melancolia de quem habitava um quarto "frio como uma queda de pressão".

No mesmo dia, para celebrar a chegada desse conjunto de textos, o Portal publicará um perfil do autor, escrito por Humberto Werneck, uma breve cronologia e ainda um áudio da crônica, lida pelo ator Luiz Octavio Moraes.

As negociações para publicar Carlinhos Oliveira foram iniciadas há um ano. Então coordenadora de Literatura do IMS, Elvia Bezerra procurou Regina Egito, sobrinha do escritor e professora no Departamento de Letras e Línguas da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Regina autorizou entusiasticamente a publicação, entendendo a importância de se divulgar uma obra que transcende o imediatismo do jornal diário. Katya Moraes e Humberto Werneck selecionaram um primeiro conjunto de 18 crônicas, ao qual deverão se somar outros mais tarde.

Carlinhos era um daqueles cariocas da gema nascidos em qualquer outro lugar do país. No caso, Vitória, Espírito Santo, em 1934. Mudou-se aos 18, sozinho, para o Rio, onde aos poucos foi exercitando a condição de observador dos costumes da cidade. Escreveu sobre a praia, o verão, Rubem Braga e seu sósia (numa crônica de janeiro 1961, no Suplemento Dominical do Jornal do Brasil, em que atribuía ao também cronista capixaba, 20 anos mais velho, "a descoberta do que é ser moderno"), sobre Camus e Fellini, mas também sobre o rapaz com uma rosa na mão numa esquina de Ipanema. Ou sobre a barata, "animal de estimação" que o acompanhava nas incursões à geladeira no apartamento de Copacabana em que alugara um quarto, em seus primeiros tempos no Rio.

Comentava temas do momento, como um julgamento em Belo Horizonte em que uma mulher fora condenada por "adultério espiritual" ("Cinderela") mas também assuntos perenes, como na crônica "Regulamento da chuva", espécie de decálogo para se admirar a água que cai do céu. A partir de certa época, passou a produzir para o JB de um posto privilegiado: a varanda do Antonio's, mítico bar no Leblon onde escritores, músicos, jornalistas e poetas se reuniam. Ali, munido de sua máquina de escrever, Carlinhos tinha mesa cativa. E copo de whisky idem.

No livro Um novo animal na floresta, lançado em 1981, cinco anos antes de morrer precocemente, aos 51, ele se definia como “surrealista por temperamento, anarquista por indisciplina de berço, boêmio por amor à vagabundagem, agregado à elite pensante por acaso”. Era tudo isso, mas principalmente um cronista que olhava com poesia e acidez o mundo à sua volta. Os leitores do Portal da Crônica Brasileira poderão confirmar.