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Bolsa IMS de Pesquisa em Fotografia


Anexo I
Eixos temáticos

1. Amazônia de dentro. Leitura indígena sobre o conjunto de fotografias editadas no álbum [Résultat d'une Expédition Photographique sur le Solimões ou Alto Amazonas et Rio Negro]

Esta bolsa se destina a pesquisadores indígenas, preferivelmente originários de povos do Alto Solimões/Amazonas e Rio Negro.

A expedição realizada por Albert Frisch foi motivada pelo desejo de apresentar em primeira mão, sobretudo a interessados estrangeiros, a Amazônia em imagens “reais”. O rótulo d'après nature (tomadas da realidade), que acompanha todas as fotografias do conjunto, funcionava como uma espécie de garantia de autenticidade para as imagens de um território paradoxalmente mítico e concreto, pois despertava a cobiça das mentalidades colonizadoras pelas riquezas que abrigava e pelo que poderia vir a produzir, se fosse “bem explorada”. Não por acaso, a expedição de Frisch foi realizada no justo momento em que a Amazônia se tornava potencialmente alcançável a qualquer um, graças à recentíssima permissão, dada pelo governo imperial, da navegação comercial internacional pelo rio Amazonas e seus afluentes.

Apesar da anunciada fidelidade ao real, várias das imagens realizadas por Frisch, sobretudo os retratos, resultaram de operações posteriores de edição, tais como recortes, colagens e manipulações, que acabaram por transformar drasticamente o que o fotógrafo viu no local. Por vezes explicadas como recursos utilizados para a superação das limitações técnicas da técnica do colódio úmido utilizada por Frisch, essas intervenções operadas nas fotografias, como o recorte dos retratados de seu ambiente natural e sua reinserção em “fundos” intercambiáveis, não causaram maiores estranhamentos, e foram de certa forma naturalizadas por estudos posteriores sobre a obra.

Não deve ter sido uma tarefa simples para o fotógrafo e seu assistente a preparação das chapas de vidro, o manuseio dos produtos químicos, a revelação imediata das fotografias conforme as exigências do colódio úmido, em locais tão remotos e em laboratórios improvisados, em condições adversas de alta umidade e de calor.

Tampouco deve ter sido fácil para as pessoas fotografadas, indígenas aparentemente com pouco contato com brancos, ou mesmo para aqueles que já viviam em aldeamentos ou na proximidade das zonas mais urbanizadas, permanecerem imóveis, diante de uma estranha caixa quadrada com um orifício.

Embora não saibamos como Frisch estabeleceu a comunicação com as populações nativas, é visível aos olhos atuais o desconforto estampado nos rostos e nos corpos de quase todos os fotografados, sobretudo das mulheres.

Frisch buscou constituir uma documentação fotográfica de pessoas, paisagens, vilas nascentes, em um momento bastante emblemático, pouco antes que o ciclo da borracha transformasse radicalmente a região. A ordenação das imagens indica com clareza a intenção de estruturar uma narrativa a partir do roteiro da viagem. Os textos explicativos sobre as fotos, com certo verniz científico, buscam fornecer ao leitor/espectador informações precisas. Apesar dessa aparente objetividade, contudo, parte da reportagem realizada por Frisch, parece paradoxalmente reiterar o imaginário ocidental sobre a Amazônia, em seu aspecto ficcional, mesmo tendo sido realizada por meio da fotografia.

A bolsa busca estimular a produção de leituras críticas sobre as fotografias que integram o álbum de Frisch, do ponto de vista dos povos retratados. Nessa discussão, onde as questões raciais são centrais, o lugar das imagens de indígenas e da população mestiça não pode deixar de ser discutido.

A ideia é confrontar as narrativas visuais e textuais construídas pelo fotógrafo, com a experiência e a visão de mundo indígenas, para evidenciar outros sentidos e significados presentes nas primeiras fotografias sobre a região amazônica, ocultos ao e ocultados pelo olhar colonial. Seria possível recontar a expedição fotográfica de Frisch a partir do lugar de fala dos povos retratados?

Entre os caminhos possíveis, sugerimos partir do próprio significado do Rio Amazonas para os povos que nele habitam, e contrastá-lo com o lugar e a forma que Frisch lhe atribui em suas representações. Da mesma forma, sugere-se interrogar as representações e informações fornecidas no álbum – das pessoas, seus corpos, sua forma de morar, paisagens, árvores e animais – à luz da memória, da história e do pensamento indígena.

No processo de tensionamento das imagens, talvez seja pertinente refletir sobre a pertinência da documentação fotográfica em geral, e da obra de Frisch, em particular, como auxiliar para a memória e a história dos povos indígenas. Ainda sobre a questão da memória, e como complemento às sugestões anteriores, talvez caiba aqui interrogar como se cruzam e são lidos, do ponto de vista dos povos indígenas, os fatos históricos da cultura branca, como a abertura do Rio Amazonas à navegação internacional, e o iminente Ciclo da Borracha, momento da realização das fotografias de Frisch.

Povos identificados por Frisch em suas fotografias. Em itálico a grafia impressa nas pranchas:
Tecunas (Ticuna), Miranhas (Miranha), Caixana (Kaixana), Amauás (Omaguá, Kambeba), Pacé (Passé), Muras (Mura), Marauá (Maraguá ?) e Tapuyas (Tapuia).

O alemão também fotografou indígenas bolivianos descritos como barqueiros ou remadores, assim como famílias e mulheres mestiças (Métis), nas proximidades de Manaus.

Eixo 2: A Amazônia por Frisch e seus contextos, nas coleções do IMS

Destinada a pesquisadores em geral, a bolsa também encoraja candidaturas de pesquisadores indígenas para este eixo temático.

Além de terem sido praticamente as únicas imagens fotográficas de populações nativas e das paisagens do Alto Solimões por cerca de duas décadas1, as fotografias de Albert Frisch foram produzidas no contexto de uma autodeclarada expedição fotográfica, uma viagem que teve a finalidade exclusiva de realizar imagens, não estando a serviço da documentação de atividades científicas ou de missões governamentais.

Dessa expedição resultaram cerca de 120 imagens. Os negativos originais em vidro não sobreviveram. Afora os escassos exemplares conhecidos do álbum completo2, chegaram até nós diversas versões das mesmas matrizes que foram veiculadas e distribuídas amplamente pelo autor e por George Leuzinger, assim como por seus herdeiros, em contextos diversos do conjunto original.

Pouco tempo depois de sua produção, as imagens passaram a integrar coleções e projetos etnográficos ainda nos primórdios dessa ciência, circularam por bibliotecas da realeza europeia, ou simplesmente dividiram espaço com outras imagens com as quais não necessariamente possuíam uma relação direta.

Embora não muito numerosas, as imagens de Frisch presentes nas coleções do IMS testemunham alguns dos percurso que elas seguiram, além do álbum original. À diferença da experiência das imagens de um único álbum, a análise comparativa das diversas versões das mesmas fotografias existentes em várias coleções, permite compreender a natureza das operações que o fotógrafo realizou sobre as matrizes, algumas apenas perceptíveis a olhares muito atentos.

A segunda linha de pesquisa para a bolsa IMS destina-se, portanto, à análise e reflexão das imagens produzidas pelo alemão, tanto em sua obra completa, como enquanto integrantes de outras coleções e obras. O estudo das fotografias de Frisch, a partir dessas duas situações, permitirá interrogar o álbum e sua narrativa, com auxílio da comparação das várias versões existentes, e ao mesmo tempo problematizar as mesmas imagens enquanto formadoras de outras construções, não previstas pelo autor.

Mais do que elencar as diferenças entre elas, o estudo comparativo das várias versões das fotografias pode fornecer instrumentos para melhor responder a pergunta sobre como podemos hoje compreender e dimensionar a obra que Frisch construiu sobre a Amazônia. Estudar as fotografias produzidas pela expedição fotográfica de Frisch em seu convívio com outras imagens contemporâneas a elas, e outras visões sobre temáticas semelhantes nos vários álbuns e coleções, por outro lado, pode também contribuir para a discussão sobre o lugar que a Amazônia ocupou na construção de outros imaginários formados por meio da fotografia.

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1 Em 1865, Walter Hunnewell, voluntário integrante da Expedição Thayer, fotografou em Manaus pessoas representativas, de acordo com o Louis Agassiz, chefe da expedição, da mestiçagem racial. As fotografias foram realizadas num estúdio improvisado na sede da expedição, e provavelmente registrou mulheres, homens e crianças pertencentes a elite local. As fotografias têm sido objeto de importantes releituras, que problematizam tanto os propósitos da expedição Thayer, quanto seu idealizador e a ideologia que gerou as imagens.
2 Até segunda ordem, existem apenas três álbuns completos da expedição de Frisch. O primeiro, no Weltmuseum Wien, em Viena, com 98 pranchas, encadernado e intitulado Amazonas; o segundo no IMS, sem título nem encadernação, com 100 pranchas, das quais faltam 2, e o terceiro intitulado Vistas de Amazonas. Imperio do Brasil, encadernado, contendo a relação completa de 98 pranchas, mas apenas 86 encadernadas. Este último não foi localizado. Os álbuns restantes, de época, não possuem todas as pranchas.

Anexo II
A expedição fotográfica de Frisch no acervo do IMS

1. Álbum [Résultat d'une Expédition Photographique sur le Solimões ou Alto Amazonas et Rio Negro], 1869

Albert Frisch/ Editado pelo autor e por Georges Leuzinger

Existem diversas versões da obra, com outros títulos, poucas porém são completas. A edição que se encontra no IMS não é encadernada. Possui cem pranchas numeradas, sendo 98 com imagens assinadas por Frisch e duas com reproduções fotográficas de desenhos realizados por Franz Keller, em sua expedição ao Rio Madeira. Faltam as pranchas 12 e 23.

As fotografias são coladas em cartões originais da Casa Leuzinger. Contém títulos e subtítulos informativos sobre cada imagem.

Frisch não organizou as fotografias por conjuntos temáticos. A numeração das pranchas, que obedece ao itinerário da viagem, fornece também a ordem de sua fruição. As pranchas 1 a 71, registram a longa travessia pelo rio Solimões, de Tabatinga até Manaus. A partir da prancha 72 até a 98, entramos no território do Rio Negro. As duas últimas são alusões à expedição pelo Rio Madeira, comandada pelos engenheiros Joseph e Franz Keller, da qual Frisch não participou.

O álbum é pontuado por vistas das estações de parada dos vapores. No trajeto entre elas, Frisch registra indivíduos ou famílias dos povos encontrados, suas habitações, as paisagens e as espécies botânicas locais.

Embora as imagens deste conjunto sejam muito similares àquelas presentes em outros álbuns, várias são idênticas e possuem a mesma numeração, vale atentar que não são todas iguais. Sugerimos que sejam comparadas com as imagens do álbum Amazonas que se encontra no museu etnográfico Welt Museum Wien, uma das poucas versões completas com 98 pranchas, disponível online, e com o álbum Views in the Amazon Valey, versão com 52 pranchas, sendo 48 de Frisch, no acervo da biblioteca da Universidade de Brown.

 

2. Álbum Voyage au Brésil, 1879 / Coleção Gilberto Ferrez

Vários autores

O álbum recria a viagem do Duque de Saxe, Luis Augusto Maria Eudes de Saxe Coburgo-Gota (1845-1907), príncipe alemão, e de seu irmão Fernando de Saxe, futuro rei Fernando I da Bulgária, ao Brasil, em 1879.

Casado com a Princesa Leopoldina, filha de D. Pedro II e de Dona Teresa Cristina, o Duque de Saxe ficou viúvo em 1871. Mesmo tendo escolhido morar no exterior a partir de então, continuou viajando com frequência ao Brasil para visitar seus filhos, cuja criação ficou à cargo da família imperial.

O álbum, com 95 fotografias, documenta a viagem realizada entre junho e julho de 1879 e apresenta vistas das cidades onde o Navio Niger fez escala, a começar por Lisboa, passando posteriormente por Recife e Salvador, antes de aportar ao Rio de Janeiro. O álbum também registra os lugares visitados na Capital, onde se destacam as fotografias do Palácio de São Cristóvão e seus jardins, morada de seus sogros, o Jardim Botânico e suas incursões às cidades serranas de Petrópolis, Nova Friburgo, Teresópolis e Itatiaia. Nessas imagens também há alusões ao circuito da Corte, como o Palácio Imperial e a casa do Conde d´Eu, seu primo, casado com a Princesa Isabel.

É provável que algumas das fotografias dos lugares visitados tenham sido realizadas por fotógrafos contratados especialmente pelo Duque, mas existem outras adquiridas pelo viajante, de lugares não necessariamente visitados, como as vistas de São Paulo, de Militão de Azevedo, ou aquelas realizadas por Marc Ferrez no âmbito da Comissão Geológica do Império, em 1875. Dentro das fotografias de lugares não visitados, encontram-se sete fotografias de Albert Frisch, realizadas durante sua expedição ao Alto Amazonas. Uma oitava imagem descrita como sendo da Amazônia, é em realidade uma cachoeira em Petrópolis. Nenhuma das fotografias do álbum menciona as autorias.

Gilberto Ferrez, proprietário anterior do álbum, realizou algumas anotações em cada página, atribuindo autoria às imagens, a maior parte delas a seu avô, Marc Ferrez. É necessário uma pesquisa mais aprofundada para confirmar boa parte dessas atribuições.

3. Coleção Leibniz - Institut für Länderkunde, Leipzig

Um convênio com o Leibniz-Institut für Länderkunde (Instituto de Geografia Leibniz) permitiu ao IMS o comodato dos arquivos digitais de algumas coleções referentes ao Brasil, presentes na instituição alemã.

O acervo disponível no IMS é formado por três coleções. A maior, foi reunida pelo geólogo e vulcanólogo alemão Moriz Alphons Stübel (1835-1904). Outras duas foram organizadas respectivamente pelo etnólogo alemão Paul Ehrenreich (1855-1914) e pelo geógrafo, e posteriormente proprietário de empresa de colonização para o sul do Brasil, Hermann Meyer (1871-1932).

3.1 Coleção Alphons Stübel
O geólogo viajou pela América Latina entre 1868 e 1877. Depois de se dedicar ao estudo dos vulcões nos Andes, em companhia de seu compatriota Wilhem Reiss, esteve no Brasil, entre 1875 e 1876. Além de coletar materiais variados para estudos geológicos, etnográficos e antropológicos, Stübel também reuniu cerca de 2000 fotografias dos países por onde viajou. No Brasil, adquiriu pouco mais de 200 fotografias, diretamente dos ateliês fotográficos das cidades por onde passou. Em Belém, obteve imagens de Filipe Augusto Fidanza; em Salvador, um conjunto significativo de fotografias em formato de carte de visite de pessoas negras, produzidas pelo estúdio de Alberto Henschel, e no Rio de Janeiro, adquiriu na Casa Leuzinger a coleção mais numerosa, com fotografias do Rio de Janeiro e da Amazônia, produzidas por Frisch. A coleção Stübel possui ainda fotografias de Marc Ferrez, realizadas em 1875 a serviço da Comissão Geológica do Império. Tal Comissão foi chefiada por Charles Hartt, geólogo que, dez anos antes, havia participado da Comissão Thayer, e foi aluno de Louis Agassiz.

De acordo com Frank Stephen Kohl, pesquisador alemão, a coleção possui 66 imagens da Amazônia, de autoria de Frisch. Entretanto, uma delas, reproduzida no álbum completo, reproduz imagens de Franz Keller. A segunda fotografia de um pôr do sol no Amazonas, não consta de nenhuma outra obra contendo imagens da expedição de Frisch.

As fotografias da coleção A.S estão coladas em cartões com títulos manuscritos em alemão, provavelmente da mão do próprio Stübel.

Outras três imagens pertencentes à edição realizada por Leuzinger e Frisch também se encontram na Coleção Leibniz-Institut, mas não estão creditadas à Coleção Stübel.

3.2 Coleção Paul Ehrenreich
Ehrenreich fez parte da nova geração de etnólogos alemães que viajou pelo Brasil e outros locais para estudar as populações indígenas. Sua primeira expedição ao Xingu data de 1887-88, duas décadas depois da viagem de Frisch. Fazem parte da coleção do Leibniz- Institut fotografias dos povos indígenas no Alto Xingu e no Rio Purus, com data aproximada de 1894. O etnólogo teve contato com Frisch quando preparava a edição de seu livro Beiträge zur völkerkunde Brasiliens (Contribuições para a etnologia do Brasil), publicado em 1891 pelo Museu Real de Etnologia de Berlim. As páginas finais da publicação contém reproduções fotográficas de diversos povos indígenas, entre os quais Karajá, Paumari e Apurinã de autoria do próprio Ehrenreich, impressas em colótipo por Albert Frisch. O etnólogo adquiriu 24 imagens da expedição de Frisch, que atualmente se encontram no espólio de Walter Lehman, no Instituto Ibero-Americano, em Berlim.

3.3 Coleção Hermann Meyer
Entre 1895 e 1897, Meyer realizou sua primeira grande expedição pelo Alto Xingu. Mapeou rios e diversos povos indígenas da região. A coleção do Leibniz Institut possui apenas quatro imagens dessa viagem. Meyer acabou por desistir dos estudos etnográficos e abriu uma empresa de colonização para atrair alemães para o sul do Brasil. A sua coleção fotográfica também possui fotografias das colônias por ele criadas: Xingu e Neu-Württemberg, no Rio Grande do Sul, e imagens do Rio de Janeiro.

4. Álbum Brasilien. 106 Photographien. Aufgenomen von Albert Frisch Senior. Um 1860

(Álbum Brasil. 106 fotografias. Registrado por Albert Frisch Senior. Cerca 1860)

O álbum foi editado postumamente pelo filho de Frisch, Albert Frisch Junior, encarregado da casa editorial Kunstanstalt Albert Frisch, após a morte de seu pai. A edição intercala fotografias da expedição à Amazônia, com imagens do Rio de Janeiro e Petrópolis, indicando a pouca intimidade que o filho de Frisch tinha com a obra fotográfica de seu pai realizada no Brasil.

De acordo com o texto de apresentação, o álbum data de 1930, e sua realização teria sido provocada pelo contato do alemão Phiilipp von Luetzelburg, (1880-1948) botânico da Comissão Rondon com Frisch Junior.

Von Luetzelburg teria feito contato com a Kunstanstalt Albert Frisch para uma possível encomenda de edição das fotografias da Comissão Rondon. A ideia de publicar imagens do Brasil motivou Frisch Junior a enviar ao botânico o conjunto das fotografias realizadas por seu pai no Brasil. A recepção entusiasta das imagens acabou incentivando Frisch Junior a reunir em álbum todas as imagens remanescentes no arquivo, produzidas por seu pai, além de publicar uma carta de Von Luetzelburg. No álbum Brasilen, além das 106 fotografias de Frisch, foram acrescentadas seis imagens dos povos Uanana e Tukano realizadas pelo próprio von Luetzelburg no Alto Rio Negro, no final da década de 1920.

Von Luetzelburg viveu mais de duas décadas no Brasil. Trabalhou na Inspetoria de Obras Contra as Secas e atuou, sobretudo, no nordeste do país. A partir de 1927 integrou o Serviço de Inspeção de Fronteiras, dirigido por Cândido Rondon, fazendo frequentes viagens à Amazônia.

Apesar de sua contribuição para o conhecimento da flora brasileira, é impossível dissociar a figura de Von Luetzelburg de suas nefastas escolhas após o retorno à Alemanha em 1938. Recrutado por Heinrich Himmler, primo de sua esposa, para chefiar o departamento de botânica da Ahnenerbe, a organização oficial encarregada de difundir suas teorias raciais nazistas, von Luetzelburg ingressou na SS e utilizou seus conhecimentos botânicos para o desenvolvimento de pesquisas sobre venenos. Von Luetzelburg teve ainda contatos eventuais com Sigmund Rascher, médico conhecido por suas experiências criminosas em humanos, que foi assassinado pelo próprio Himmel antes do fim da guerra.

5. Álbum Rio de Janeiro et ses environs

(Rio de Janeiro e seus arredores)

Editado por George Leuzinger provavelmente em 1868, contém 42 fotografias, em sua maioria da cidade do Rio de Janeiro, com imagens de Niterói e Petrópolis. Do álbum também constam sete fotografias da expedição de Frisch à Amazônia, entre imagens de populações indígenas e mestiças, habitações diversas e vegetação, além de ainda quatro reproduções fotográficas de gravuras europeias, igualmente deslocadas do conteúdo sugerido pelo título.

As fotografias de Frisch realizadas no norte do Brasil, são apresentadas sem explicações e não estão separadas do restante das paisagens. O álbum não é encadernado, e suas pranchas são destacáveis. O estranhamento que causa a presença de imagens da Amazônia num álbum dedicado ao Rio de Janeiro e seu entorno sugere que elas foram incluídas posteriormente, por alguém próximo à Casa Leuzinger. Contudo, foi nessas condições, já com a inserção das imagens de Frisch sobre a Amazônia, que o álbum chegou ao IMS, como parte da primeira coleção fotográfica adquirida pela instituição.

6. Álbum [Família Leuzinger]

Combinação de álbum de família e de livro de recortes, organizado nas primeiras décadas do século XX. Provavelmente foi iniciado por Edmond Leuzinger, filho de Georges, a partir das fotografias da família e do acervo fotográfico da Casa Leuzinger, e recebeu novas inserções, de gravuras, desenhos e outras estampas ao longo do tempo. Apesar de seu ecletismo, o álbum possui algumas raridades como as ampliações de fotografias do Rio de Janeiro e Petrópolis, da Casa Leuzinger. Nele podemos encontrar também retratos e cenas de lazer da família, fotografias do Colégio de Meninas, fundado pela Baronesa de Geslin, irmã de Anne Antoniette de Authier (Eleonore), esposa de Georges Leuzinger, que dirigiria o colégio quando da partida de sua irmã para Europa. O álbum guarda ainda outras lembranças de feitos familiares, como as reproduções fotográficas dos desenhos de Franz Keller, genro de Leuzinger, durante a expedição ao Rio Madeira. Dele constam ainda onze fotografias da expedição de Frisch, aqui atribuídas erroneamente a Franz Keller por meio da notação F. Keller no passe-partout das imagens.

Embora tenha eminente cunho familiar, diferente de outros álbuns e coleções aqui mencionadas, que tem um caráter público e de difusão, o álbum da família Leuzinger também oferece informações relevantes e contextualiza as imagens de Frisch no âmbito do universo social e familiar de Georges Leuzinger.

OUTRAS COLEÇÕES

Pranchas avulsas e reproduções das imagens da expedição fotográfica de Frisch também integram as coleções Mestres do Século XIX (001) e Gilberto Ferrez (007) no IMS. À diferença das situações acima mencionadas, onde as imagens de Frisch estão em ambientes circunscritos a um único álbum, ou integram uma coleção com afinidades temáticas evidentes, a heterogeneidade e abrangência das coleções aqui mencionadas pode ampliar em demasia o foco da análise contextual das fotografias de Frisch em relação ao restante da coleção. De qualquer forma, vale tecer algumas observações sobre as duas coleções.

7. Coleção Gilberto Ferrez

Para além da enorme coleção de negativos de vidro de seu avô, Marc Ferrez e dos álbuns de diversas autorias, Gilberto Ferrez guardou em fichários um número significativo de fotografias do século XIX e das primeiras décadas do século XX. Organizados por vezes por localidade, ou por autor, alguns fichários também contém parte da documentação que Gilberto Ferrez recolhia em suas pesquisas. É possível encontrar no mesmo fichário recortes de jornal, anotações manuscritas, cópias ou mesmo documentos originais e fotografias de época. Nem todas as fotografias dos fichários, contudo, são originais. Boa parte delas é composta por reproduções posteriores, por vezes sem qualidade, pois os fichários funcionavam como uma espécie de esboço de curadorias a serem desenvolvidas por Ferrez em suas publicações e projetos.

É comum também encontrar anotações de Gilberto no verso das fotografias, com atribuição de data e autoria. Por vezes, essas informações são imprecisas, ou mesmo contém erros, que não raro foram reproduzidos em livros e publicações de outros autores sobre a fotografia no Brasil. Uma dessas atribuições diz respeito à data das fotografias de Frisch na Amazônia. Por algum motivo, Gilberto atribuiu a data de 1865 às imagens de Frisch. Assim consta do fichário A5P3FG4-Álbum, inteiramente dedicado às reproduções de fotografias do alemão na Amazônia. Essa informação levou pesquisadores a atribuir a Frisch o pioneirismo nos registros fotográficos na cidade de Manaus, antes mesmo de ser visitada pela Expedição Thayer. Graças às pesquisas de Stephen Kohl, hoje se entende que a viagem de Frisch ocorreu somente no final de 1867.

Na coleção Gilberto Ferrez também se encontram negativos de vidro e ampliações de imagens dos indígenas Botocudos, produzidos por Marc Ferrez no sul da Bahia, durante seu trabalho como fotógrafo da Comissão Geológica do Império, chefiada por Charles Hartt em 1876. Aluno de Louis Agassiz, e um dos membros da Expedição Thayer, Hartt publicou em 1870 o relatório de seu trabalho nessa expedição intitulado Geology and Physical Geography of Brazil, dedicado a seu professor, onde escreveu, no apêndice, um estudo denominado “On the Botocudos”. É provável que as imagens realizadas por Ferrez seis anos mais tarde tenham sido encomendadas pelo próprio Hartt, em complementação a seu estudo realizado sob o comando de Agassiz.

A coleção Gilberto Ferrez guarda ainda o álbum Voyage au Brésil, já descrito individualmente.

8. Coleção Mestres do Século XIX

A primeira coleção adquirida pelo IMS, traça um panorama da produção dos estúdios fotográficos no final do século XIX e primeiras décadas do XX, contendo uma grande quantidade de retratos, em carte de visite. Possui também conjuntos de autores mais conhecidos, como Marc Ferrez, Augusto Malta, Guilherme Gaensly e 24 álbuns, entre os quais os dois já mencionados relacionados a Georg Leuzinger.

A coleção possui 20 pranchas avulsas do álbum editado da expedição à Amazônia de Frisch.