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Que país é este?

A câmera de Jorge Bodanzky durante a ditadura brasileira, 1964-1985


Textos da exposição

Apresentação

A exploração do Trabalho

 
Iracema: uma transa amazônica (1974), filme mais conhecido de Jorge Bodanzky, une ficção e documentário para narrar a história de amor e desamor entre uma jovem mulher indígena, forçada à prostituição, e um caminhoneiro gaúcho, que vê na construção da rodovia Transamazônica uma chance fácil de enriquecimento ilícito. A prostituição de menores, a escravização de trabalhadores rurais e a violência contra povos indígenas são alguns dos temas denunciados no filme pela interação original entre atores profissionais, amadores e transeuntes – procedimento que até hoje provoca desconforto e comoção. Para escapar à atenção dos militares, a equipe de filmagem estacionava sua Kombi, improvisava a cena e fugia. Não havia take repetido. O filme afrontava o Brasil oficial e permaneceu censurado até 1981, a despeito do sucesso internacional.

As consequências dos projetos faraônicos levados a cabo pelo governo militar e pela iniciativa privada também foram reveladas no longa de ficção Gitirana (1975, censurado) e no documentário Jari (1979). Gitirana narra as desventuras de um homem-mulher operário em busca de um reino encantado, tendo como pano de fundo a construção da enorme barragem de Sobradinho (BA), que levou à expulsão de milhares de moradores da região. Jari expunha a destruição ambiental e as aviltantes condições de trabalho nas fábricas do empresário americano Daniel Ludwig, implantadas na Amazônia.

Em Iracema (1974), Gitirana (1975) e Os Mucker (1978), Bodanzky trabalhou com a fábula e a encenação para abordar a realidade de forma indireta e despistar censores. Suas imagens só foram possíveis com financiamento alemão, porque não interessavam ao governo brasileiro. Jari (1979), Terceiro milênio (1980) e Igreja dos oprimidos (1985), feitos conforme caminhávamos para a redemocratização, cutucavam a ferida sem meias palavras. A maneira como personagens reais e ficcionais exaltam a violência e a própria ignorância ecoa tristes episódios do Brasil recente.

Luta e resistência

 
“Pedra não para o caminho, fogo não queima o luar”, canta um casal de trabalhadores rurais em Igreja dos oprimidos (1985), feito no ano da redemocratização. O filme denuncia a violência no campo e a atuação da Igreja Católica progressista na luta por reforma agrária em Conceição do Araguaia (PA). No cinema de Bodanzky, a música popular ocupa o papel de coro, que comenta questões sociais e morais. A ditadura ruía nas cidades, mas o interior do país seguia lutando por terras e direitos através de alianças e associações comunitárias.

Bodanzky enfocou outras formas de resistência social durante a ditadura. Na ficção Os Mucker (1978), baseado em episódio histórico verídico, uma comunidade alemã liderada pelo casal messiânico Jacobina e José Maurer resiste às investidas da sociedade local, como uma Canudos gaúcha. O longa Gitirana (1975), construído como um cordel, atualiza o sentido do cangaço na resistência nordestina e feminina durante a construção da barragem de Sobradinho (BA), no governo do general Emílio Médici.

A luta contra o machismo e o puritanismo é encarnada por mulheres, como a Jacobina de Os Mucker (acusada de “dormir com qualquer um”); a Marieta Puribão de Gitirana (que se deita com o Diabo para exterminar o pecado); e pela gilete que sela a aliança de Iracema com Tereza, em Iracema.

Os trabalhadores rurais, o movimento operário e o feminismo batalham por justiça e emancipação mesmo quando os novos valores sociais e morais afrontam a sociedade, que reage com a pá da repressão. A violência indiscriminada do Estado e do poder privado é uma estratégia de dominação, que promove o conflito até mesmo entre grupos oprimidos.

À sua maneira, Bodanzky deu imagens a uma luta coletiva, contribuindo para frear o projeto de extermínio que o ufanismo desenvolvimentista tentava manter invisível. O fim do aparato militar repressivo é substituído pela violência das milícias particulares, determinadas a evitar que a reforma agrária e a distribuição de renda avancem no país, nos lembra dom Alano Pena em Igreja dos oprimidos (1985). Hoje, a história continua.

Religião e espiritualidade

 
A religião muitas vezes acolhe e redime, oferecendo amparo e conforto contra as garras da repressão. No média-metragem Caminhos de Valderez (1971), estreia de Bodanzky na direção, uma mulher de classe média é atormentada por demônios e pela ditadura enquanto busca refúgio no tarô e no movimento religioso do Vale do Amanhecer, fundado pela médium sergipana Tia Neiva em Brasília. Em Gitirana (1975), um menino se transforma em mulher depois da morte da avó, com a bênção do padrinho. Na pele de Ciça, Maria Bonita ou Marieta Puribão, o ele/ela parte em busca do reino perdido de Miramar, para escapar ao destino operário. “Livrai-nos do pecado, da peste, da fome, da seca, da inundação e do dinheiro”, diz, encarnando uma beata revolucionária.

À sombra de uma árvore, o padre Ricardo Rezende celebra a Igreja dos oprimidos (1985), interpretando a Bíblia como um manual de guerrilha. Rezende pede paz na Nicarágua, “país que vive sob a ameaça de invasão dos Estados Unidos”, e na África do Sul, “onde os negros têm sido pisoteados por uma minoria branca”. Um trabalhador rural homenageia “os nossos índios, os verdadeiros donos desta terra, que tombaram sob o jugo dos opressores e capitalistas”. Em vez de apenas narrar suas histórias, o microfone amplifica a voz dos trabalhadores, acusados de subversão e terrorismo. O filme registra o momento histórico em que a Igreja Católica se distanciou do apoio inicial à ditadura e engrossou as fileiras da resistência, graças à Teologia da Libertação. Em Terceiro milênio (1980), contudo, as raras imagens do irmão José da Cruz revelam a evangelização do povo Ticuna através de um catolicismo popular que tentou apagar a espiritualidade tradicional e transformar povos originários em força de trabalho. Em Iracema (1974), a devoção popular do Círio de Nazaré, em Belém, é também um rito de iniciação da jovem indígena na decadência da sociedade capitalista. A espiritualidade e a religião são bases indissociáveis das alianças comunitárias, razão pela qual seguem determinantes para navegar o Brasil contemporâneo.

O que é progresso?

A ditadura vendia milagre econômico e entregava destruição ambiental, violação de direitos e corrupção. Nos anos mais violentos do regime, Bodanzky usou a ficção, a atuação histriônica e analogias históricas para abordar conflitos candentes. “Natureza é mãe coisa nenhuma. Natureza é meu caminhão, rapaz, natureza é a estrada”, brada Tião Brasil Grande em Iracema (1974). Sua arrogância preconceituosa continua a ecoar pelo país.

Cada quilômetro da Transamazônica propagandeada pelo governo abria também um rastro de violência e destruição. Bodanzky registrou o país em disputa e enviou ao exterior algumas das primeiras cenas coloridas da Amazônia em chamas.

Em 1978, a convite de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), visitou o Projeto Jari, empreendimento do americano Daniel Ludwig, que desmatara um quinhão da floresta amazônica para produzir celulose, arroz e caulim. O documentário Jari (1979) inova ao contrapor o discurso oficinal da fábrica à voz dos trabalhadores, expondo a associação deletéria entre a iniciativa privada e o governo do general Ernesto Geisel.

No cinema de Bodanzky, a câmera filma e dirige a ação, enquanto o som costura o enredo, alternando ponto e contraponto. “O índio é um verdadeiro ecólogo. Um homem que sente profundamente a complexidade, a harmonia, a integração daquela floresta”, declara o ambientalista José Antonio Lutzenberger. O cinema de Bodanzky era a contranarrativa do discurso oficial, que cooptava até mesmo jornais e revistas.

O convite para filmar a viagem da CPI fora feito pelo senador amazonense Evandro Carreira, que ganhou seu próprio documentário. Terceiro milênio (1980) acompanha a viagem de Carreira pelo rio Solimões durante sua campanha pelo governo do estado. “O que é o progresso?”, provoca. Preconceituoso e ao mesmo tempo visionário, Carreira sintetiza paradoxos do período e antecipa dilemas atuais: “Ou tu me inventarias, ou tu me investigas, ou tu me decifras, homem do terceiro milênio, ou eu te devorarei com a devastação, com deserto e com o inferno que será a futura Amazônia”, conclui.

Câmera ativa

 
A experiência de Jorge Bodanzky como câmera em filmes de outros diretores é fundamental para entender seus próprio trabalhos na direção. Bodanzky estudara direção de fotografia na Escola de Design de Ulm, sob a batuta do cineasta Alexander Kluge. Recém-chegado da Alemanha, estreou como câmera no filme O profeta da fome (1968), de Maurice Capovilla. A fábula onírica acompanha uma trupe circense decadente, determinada a garantir seu público. Distante do realismo do Cinema Novo, o filme abusa da lente grande-angular para abraçar o espectador com a cena ou oferecer o ponto de vista do protagonista. Nesse caso, o faquir Alikan, interpretado por José Mojica Marins — mais famoso como o Zé do Caixão —, que descobre no jejum o sucesso almejado. O filme parodia a aventura de viver num país precário, em que todos lutam por trabalho, dignidade e comida.

Em Hitler III° Mundo (1968), longa do escritor José Agrippino de Paula, Bodanzky incorpora a ousadia libertária do autor de Panamérica (1967) para filmar a história de ascensão de um líder nazista no Terceiro Mundo. Rodado clandestinamente em São Paulo, o filme encadeia cenas perturbadoras, como a do samurai assassino vivido por Jô Soares, com efeitos de cinema arrojados, como o giro da câmera sobre si mesma. Para filmar, Bodanzky juntava pontas de chassi dos outros filmes que fazia, descolava uma câmera emprestada e ligava para o Agrippino. Ele então criava a cena com os atores disponíveis, e a equipe saía para rodar no improviso. Filmado simultaneamente à instauração do AI-5, o enredo sobre a ascensão do totalitarismo continua a ser tristemente visionário.

O longa Compasso de espera (1969), dirigido pelo dramaturgo Antunes Filho, foi pioneiro em abordar o conflito racial no cinema através da história de um jovem poeta negro (Zózimo Bulbul) e sua namorada branca. A violência do racismo é expressa pelo contraste dramático entre o preto e o branco da película, que expõe o conceito rigoroso desenvolvido pelo artista português Fernando Lemos e conduzido por Bodanzky com apoio das artistas Maria Bonomi e Amelia Toledo.

Entre 1968 e 1973, Bodanzky fez câmera de inúmeros filmes, engrossando a produção alternativa. A experiência e a agilidade na movimentação da câmera permitiu ao cineasta usá-la para direcionar atores, planos, cortes e cenas em seus próprios filmes.

Cronologia

 

1942-1962

Jorge Bodanzky nasce em São Paulo (SP), filho de austríacos que vieram para o Brasil em 1937, às vésperas da anexação ao Reich alemão. Frequenta o Instituto Mackenzie, o Colégio Bandeirantes e o Colégio Piratininga, em São Paulo. Passa meses em internato de orientação anarquista em Rekawinkel, Áustria. De volta a São Paulo, cria com amigos a companhia de teatro de fantoches Sambalelê.

Em 1960, o presidente Juscelino Kubitschek inaugura a nova capital, Brasília. Em 1961, Jânio Quadros é eleito presidente e renuncia ao cargo em poucos meses. O vice-presidente João Goulart assume a presidência e promete reformas sociais de base.

 

1963-1964

Ingressa no curso de arquitetura da recém-inaugurada Universidade de Brasília, estimulado pelo projeto pedagógico inovador. Tem aulas com os artistas Amelia Toledo, Athos Bulcão e Luis Humberto, entre outros.

Em 1964, um golpe civil-militar depõe o presidente João Goulart, com apoio dos Estados Unidos. O marechal Humberto Castelo Branco assume a presidência do Brasil. O câmpus da UnB é invadido por militares, que prendem professores e alunos, proibindo manifestações estudantis. A ditadura suspende direitos políticos e começa a perseguir opositores.

 

1965

Participa das filmagens de Menino de engenho (1965), de Walter Lima Jr., na Paraíba.

Os militares avançam sobre as universidades. Bodanzky deixa a UnB após a saída de mais de 200 professores e assistentes, que assinam carta de demissão coletiva. Expõe fotografia na 8a Bienal de São Paulo. Entre 1965 e 1969, trabalha como fotógrafo na revista Manchete, nos jornais O Estado de S. Paulo e Jornal da Tarde, na revista Realidade e na agência Maitiry, a convite do artista português Fernando Lemos.

 

1966-1967

Em 1966, viaja a Colônia, na Alemanha, para estudar fotografia, mas desiste do curso técnico. O cineasta Alexander Kluge o convida a cursar cinema na recém-criada Escola de Design de Ulm, Alemanha. Em 1967, viaja a Berlim com um grupo do movimento estudantil para gravar o documentário Distúrbio, sobre o assassinato do estudante Benno Ohnesorg durante protesto contra a visita do xá do Irã. A pressão sobre a atuação política dos estudantes da Escola de Design de Ulm provoca êxodo de alunos. Bodanzky volta ao Brasil.

Em 1967, o marechal Artur da Costa e Silva assume a presidência do Brasil. A Fundação Nacional do Índio (Funai) substitui o Serviço de Proteção ao Índio (SNI), envolvido em denúncias de corrupção.

 

1968

O estudante Edson Luís de Lima Souto é assassinado por policiais militares no Rio de Janeiro, dando início a protestos que culminam na Passeata dos Cem Mil.

Bodanzky expõe fotografias na Galeria Astreia, em São Paulo, ao lado do artista Fernando Lemos e outros. Viaja pela primeira vez à Amazônia para reportagem da revista Realidade sobre a circulação de dinheiro falso em Paragominas (PA). A movimentação de caminhoneiros e prostitutas em um posto de estrada será o embrião de seu primeiro longa-metragem, Iracema: uma transa amazônica (1974). A Amazônia se tornará epicentro de sua obra.

Faz direção de fotografia em Hitler IIIº mundo (1968) e Rito do amor selvagem (1969) de José Agrippino de Paula; O profeta da fome (1969), de Maurice Capovilla; e Compasso de espera (1969), de Antunes Filho; entre outros.

O presidente Costa e Silva oficializa o autoritarismo com o Ato Institucional no 5, inaugurando os Anos de Chumbo.

O Congresso Nacional é fechado, direitos políticos são cassados, a censura e a tortura transformam-se em política de Estado.

 

1969-1970

Uma junta militar assume a presidência do Brasil e promulga nova Constituição, endurecendo o regime. O Congresso Nacional elege o general Emílio Garrastazu Médici para a presidência. Médici lança o Programa de Integração Nacional (1970) para ocupar a Amazônia com rodovias, extração de minérios e colonos de todo o país. O plano ignora populações indígenas. Tem início a construção da rodovia Transamazônica (BR-230), nunca concluída. Carlos Marighella, líder da Aliança Libertadora Nacional, é morto por agentes do Estado. A seleção brasileira de futebol vence a Copa do Mundo. São criados Destacamentos de Operação de Informação (DOI) para controlar atividades e perseguir opositores. Os DOI-CODI se tornam centros de tortura praticada por agentes do Estado.

Bodanzky trabalha para a revista Realidade e dá aulas de fotografia e câmera na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP).

 

1971

Dirige seu primeiro filme, Caminhos de Valderez (1971), em parceria com Hermano Penna. A protagonista Valderez de Almeida estreia no cinema ao lado de atores não profissionais. O filme fica desaparecido por anos. A fotografia, antes atividade principal, passa a acompanhar o cinema.

Com o repórter Karl Brugger, desenvolve reportagens para tevês alemãs sobre a censura nas artes, a detenção do grupo de teatro The Living Theatre, em Minas Gerais, a religiosidade em Brasília, as associações comunitárias no governo de Salvador Allende, no Chile, e entrevista o general Hugo Banzer Suárez um mês depois que assume o governo da Bolívia em um golpe de Estado. Cria a produtora Stopfilm, com o parceiro
Wolf Gauer, em Munique.

Carlos Lamarca, líder da resistência armada contra a ditadura, é assassinado na Bahia.

 

1972-1974

Em 1972, viaja a Manaus com Brugger e o misterioso Tatunca Nara em busca da cidade perdida de Akakor, lenda desmentida anos depois. Com Wolf Gauer, filma documentários para o Instituto do Filme e da Imagem para a Ciência e o Ensino na Alemanha. Com José Medeiros, divide a câmera em O fabuloso Fittipaldi (1973), de Héctor Babenco e Roberto Farias. Investe na produção de super-8 para exercitar a linguagem cinematográfica. Dá aulas de cinema na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), em São Paulo, entre 1972 e 1976. Obtém financiamento da tevê alemã ZDF para seu primeiro longa-metragem, Iracema: uma transa amazônica (1974), filmado ao longo da rodovia Transamazônica. Em um programa de auditório em Belém, conhece Edna de Cássia, que protagonizará o filme sem experiência prévia em atuação.

Em 1973, Salvador Allende, presidente do Chile, é deposto por golpe militar liderado por Augusto Pinochet, chefe das Forças Armadas. No Brasil, Médici promulga o Estatuto do Índio, para afastar acusações de genocídio das populações originárias. Em 1974, o general Ernesto Geisel assume a presidência do Brasil. Entre 1972 e 1974, o Exército descobre e extermina a base de treinamento do Partido Comunista do Brasil no Araguaia, e oculta a chacina.

1975

O filme Iracema: uma transa amazônica (1974), codirigido por Orlando Senna, estreia na tevê alemã ZDF e atrai atenção internacional, mas tem a exibição censurada no Brasil. Uma agência governamental alemã compra 100 cópias do filme para distribuir em escolas.

O sucesso abre caminho para o longa Gitirana, codirigido por Orlando Senna e baseado na peça Teatro de cordel (1970). Gitirana narra as consequências da construção da represa de Sobradinho (BA), obra do governo Médici que deslocou 70 mil pessoas e criou o maior lago artificial do país. O filme é exibido na tevê alemã, mas proibido no circuito comercial brasileiro, circulando em cineclubes fechados.

Bodanzky recebe em casa o jornalista Vladimir Herzog para revelar fotos de seu pai no laboratório improvisado. Herzog é preso, torturado e assassinado dias depois no DOI-CODI de São Paulo. Sua morte mobiliza o primeiro grande protesto da sociedade civil depois do AI-5, na catedral da Sé, em São Paulo.

 

1976-1978

Iracema e Gitirana são consagrados no Festival de Cannes, França. Bodanzky cria o estúdio Stop Som, em São Paulo, com Wolf Gauer e Raquel Gerber. Filma o longa de ficção Os Mucker (1978), baseado na Revolta dos Muckers (1873-1874), episódio verídico de conflito armado entre militares e uma comunidade religiosa de Sapiranga (RS).

Em 1978, é criado o Movimento Negro Unificado (MNU). O presidente Ernesto Geisel extingue o Ato Institucional nº 5, sinalizando abertura política parcial.

 

1979

Viaja ao Pará com a CPI que investigará o polêmico Projeto Jari, do empresário Daniel Ludwig. O documentário Jari (1979), codirigido por Wolf Gauer, registra a voz dos trabalhadores e faz críticas diretas ao projeto. O filme circula em dezenas de associações e cineclubes. Os Mucker (1978) recebe o prêmio de Melhor Direção no Festival de Cinema de Gramado. Muda-se para o Rio de Janeiro, onde reside até 2005, quando
volta a São Paulo.

O general João Figueiredo assume a presidência do Brasil, que contava cerca de 800 presos políticos e 7 mil exilados. Diante de pressão popular, Figueiredo assina a Lei da Anistia, que perdoa crimes políticos. A lei é criticada por anistiar a tortura e repressão do Estado. O Congresso Nacional põe fim ao bipartidarismo.

 

1980

Entre 1980 e 1984, Bodanzky codirige reportagens com Karl Brugger para o canal alemão ARD.

Iracema (1974) obtém autorização para ser exibido no Festival de Brasília e recebe os Candangos de Melhor Filme, Atriz, Atriz Coadjuvante (Conceição Senna) e Montagem, depois de seis anos de censura. Lança Terceiro milênio, codirigido por Wolf Gauer. O river movie segue a campanha eleitoral do senador Evandro Carreira (AM) pelo rio Solimões, em território do povo Ticuna.

 

1981-1983

Iracema (1974) é liberado para exibição pela Polícia Federal, em 1981. Dirige Amazônia, o último Eldorado (1982), para o Globo Repórter, com o jornalista Carlos Alberto Luppi. Terceiro milênio (1980) é exibido em mostra paralela do Festival de Cannes, onde recebe o prêmio Jeune Cinéma. Em 1983, a Cinemateca de Paris organiza retrospectiva do cinema de Bodanzky, chancelada pelo cineasta Jean Rouch, um dos criadores do cinema direto.

Em 1982, é realizada a primeira eleição direta para governador desde o início da ditadura militar. No ano seguinte, tem início o movimento pelas Diretas Já, para retomar eleições presidenciais diretas.

 

1984-1985

Entre 1984 e 2006, trabalha com Gernot Schley para tevês alemãs. Lança o documentário Igreja dos oprimidos (1985, codirigido por Helena Salem) sobre o envolvimento da Igreja Católica na luta agrária do Araguaia (PA).

Tancredo Neves é eleito presidente do Brasil pelo colégio eleitoral, mas falece antes de assumir. A posse do vice-presidente José Sarney põe fim ao regime militar. O cardeal Joseph Ratzinger impõe silêncio obsequioso ao frei Leonardo Boff por divulgar as ideias da Teologia da Libertação.

 

1986-1987

Lança o filme Ensaiando Brecht (1986). Dá aulas de cinema e vídeo na Universidade Estadual de Campinas. Igreja dos oprimidos recebe o prêmio Margarida de Prata, oferecido pela CNBB. Filma Igor, uma aventura na Antártica (1987) e organiza uma expedição ao pico da Neblina para encontrar o local descrito no conto “O mundo perdido”, de Arthur Conan Doyle. Com Gernot Schley, filma o documentário O sonho de um pedaço de terra próprio (1987), sobre a luta dos sem-terra no Rio Grande do Sul.

 

1988-1999

A nova Constituição brasileira é promulgada, ampliando direitos dos cidadãos.

Lança o filme Universidade Quadrangular (1988). Dá aulas no Centro de Produção Cultural e Educativa da Universidade de Brasília. Lança A propósito de Tristes trópicos (1990, codirigido por Patrick Menget e Jean-Pierre Beaurenaut), sobre a obra do antropólogo Claude Lévi-Strauss. Em 1991, realiza reportagens como Surfista de trem (Canal Plus), Flor do amanhã, sobre a escola de samba infantil do carnavalesco Joãozinho Trinta, e Caça à baleia branca.

Coordena a série Ecovídeo (1995), composta de 10 programas educativos feitos para crianças da Amazônia, com participação da Universidade Federal do Pará. Lança o portal Amazonlife (1998), enciclopédia online sobre a Amazônia, no ar até 2001.

 

2000-2012

Primeira viagem do projeto Navegar Amazônia (2000), iniciativa para levar internet a escolas ribeirinhas do Amapá por meio de barco. Lança Brasília, a utopia inacabada (2002), o filme Navegaramazônia: uma viagem com Jorge Mautner (2005) e o especial Era uma vez Iracema (2005). Publica o depoimento biográfico Jorge Bodanzky: o homem com a câmera (2006), escrito por Carlos Alberto Mattos. Lança os filmes No meio do rio, entre as árvores (2009) e Pandemonium (2010). Em 2009, volta ao Alto Solimões para entrevistar os Ticuna, filmados em Terceiro milênio (1980).

Em 2012, a presidente Dilma Rousseff instala a Comissão Nacional da Verdade, para investigar as violações de direitos humanos cometidas pelo Estado brasileiro entre 1946 e 1988. O relatório final da comissão pede revisão da Lei da Anistia.

 

2013-2017

O acervo de fotos, super-8 e vídeos de Bodanzky passa a ser preservado pelo Instituto Moreira Salles. Lança Família (2014) e Photo Assis, o clique único de Assis Horta (2015), a convite da revista ZUM. Em 2016, apresenta o trabalho da Amazônia na exposição No meio do rio, entre as árvores (MIS-SP). Lança DVD de Iracema com o especial Ainda uma vez Iracema (2016), em que volta a Belém para debater a prostituição.

 

2018-2024

Dirige a série Transamazônica, uma estrada para o passado (HBO, 2019, codireção de Juliano Maciel) e Ruivaldo, o homem que salvou a Terra (2019), com João Farkas. Lança Utopia/distopia (2020) e Amazônia, a nova Minamata? (2022).

Em 2018, Jair Bolsonaro é eleito presidente do Brasil e nega o golpe militar de 1964, além de relativizar a violência da ditadura militar.

Em 2023, Lula é eleito presidente do Brasil e cria o Ministério dos Povos Indígenas, comandado por Sônia Guajajara. Joenia Wapichana é a primeira indígena a dirigir a Funai.