Stefania Bril e o livro fotográfico
Aproximações críticas
Livros em exibição
SANTILLI, Marcos. Madeira-Mamoré: imagem e memória. São Paulo: Villares, 1987. 30 x 22 cm
Texto de Stefania Bril
Um álbum revive as aventuras da Madeira-Mamoré
O Estado de S. Paulo, 9 de dezembro de 1988
O livro é feito de imagens… e palavras. “Os negros não serão contratados” — é 1878, as antigas leis de escravidão ainda valem no Brasil e a proposta da Companhia Nacional Boliviana de Navegação, empresa de cidadãos empreendedores dos Estados Unidos, de levar como força braçal os trabalhadores negros livres fica rechaçada pelo ministro brasileiro. Insustentável, por enquanto. (Notícia extraída do New York Herald de 1878, citada no livro de Marcos Santilli, Madeira-Mamoré).
É o resultado de dez anos de trabalho, milhares de quilômetros percorridos. Fruto de uma pesquisa profunda: informações recortadas dentro de textos, informações colhidas pelo fotógrafo Marcos Santilli e sua mulher Marlui Miranda, através dos depoimentos dos antigos ferroviários. História vivida. As fotos prendem e emocionam; informam, também, e muito. O fotógrafo optou por não apenas reportar, mas viver a aventura da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. Criou raízes lá em Rondônia, onde agora todos tentam desenraizar tudo. É só através de um coexistir lento, amigo e apaixonado que se consegue captar o hoje e ressuscitar o ontem: imagens feitas de cheiros e cores, de luz e… silêncio.
Marcos Santilli deixa o leitor penetrar no seu livro-mundo: sentir o cheiro de água, a brisa das ondas, o ouro do sol, o verde da mata: passa-se o dedo na imagem para apalpar a textura de uma velha locomotiva e parece que o papel couché do livro se torna, de repente, áspero.
Depois, caminha-se pelas casas e as pessoas, e quem penetra é o agora e o passado, aquele dependurado lá, na parede. Fotografias que envolvem pela magia do tempo. Ontem o rosto era liso, o olhar voltado para o futuro, curioso. Hoje são as rugas que falam, elas sabem tanto e não se cansam de contar. É só querer ouvir, Marcos e Marlui são olhar e ouvido, só. Mas a viagem não acabou. Os novos ferroviários estão lá, nos postos. Reativando a ferrovia, reativando os sonhos, azuis e dourados, como o é a cor do rosto negro do ferroviário Silas Shockness. Trabalhando agora. O fotógrafo está ao lado, fazendo o seu trabalho. Escrevendo imagens.