“Há dois protagonistas que vivem papéis duplos: a filha-cineasta e o pai-personagem. Se a relação cineasta-personagem já é, em qualquer documentário, complexa e permeada de tensões e dilemas éticos, a relação parental vai acrescentar graus ainda maiores de complexidade à obra” — observa Carla Maia sobre Os dias com ele de Maria Clara Escobar. A aproximação da filha ao pai, continua, “não se dá com precisão e segurança, mas de maneira vacilante, incerta, ao modo da tentativa e erro. Talvez venha daí a escolha de manter, em boa parte das entrevistas, os momentos que antecedem o bater da claquete – ajustar o enquadramento, colocar o microfone, testar o som. Sempre em preparação, nem pai nem filha parecem prontos para o encontro agenciado pelo filme.”
Duas viagens a Portugal, a primeira de quatro meses, a segunda de dois meses, “e um método mais automático do que resultado de uma reflexão” – observa Maria Clara –, “ele usando a construção das palavras e eu, o aparato da câmera. Ele repetindo um método de construir e eu, um de desconstruir. O que retrata e o retratado. O que olha e o que é visto. E, por que não, dentro dessa mesma lógica de relação de poderes negociados e apropriação de sua matéria, o que é pai e a que é filha. Repetimos muitas vezes este procedimento; e de maneira estranha, através da repetição, íamos nos aproximando e conhecendo pouco a pouco as armadilhas de cada um e talvez as armadilhas em que cada um estivesse preso.”