Era outubro de 1970 quando Angela Davis foi presa em Nova York, identificada como cúmplice no caso dos irmãos de Soledad, três presidiários negros acusados de assassinar um policial branco. Após ver imagens da autora e ativista algemada, o então estudante de cinema Haile Gerima teve um sonho, que materializou em Filha da resistência.
São deslumbrantes 35 minutos de loucura de uma presidiária que, interpretada pela grande Barbara O. Jones – protagonista também do posterior primeiro longa do diretor, Bush Mama –, se percebe obsediada por uma profusão de símbolos da violência sofrida por pessoas negras na América. Confinada na cela, resta à prisioneira ritualizar a ruína da libertação – e a desesperança individual se descobre no movimento da coletividade. Como comenta a ensaísta Kariima Ali, o monólogo imaginado pela personagem em muito desdobra os escritos revolucionários de George Jackson, um dos presos no caso vinculado a Davis – enquanto, do outro lado das grades, desfilam algemas, correntes, cadeiras elétricas, mas também expressões do hedonismo capitalista, como um irônico playground de tormentas que codificam a silhueta da nação americana –, ou o que Jackson chamaria de "'mercado de pulgas' do fascismo e do capitalismo de consumo".
É frontal a maneira de Gerima desbravar a substância da violência, busca mais exclamativa em seus filmes que nos de muitos de seus colegas de geração, e suas incontornáveis obras-primas inaugurais – como Filha da resistência – elegem a instituição policial como concreção contemporânea da escravidão de pessoas negras. A partir dela, aqui se desenvolve uma espécie de cosmologia moderna da opressão, cuja missão é de comunicação popular e cujo afluente final é, em tom amargo, mas luminoso, a reivindicação persistente da reunião para a rebelião.
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