Em 1952, a equipe da revista britânica dedicada a cinema, Sight and Sound, teve a iniciativa de pedir a um grande conjunto de críticos que apontassem quais seriam para eles os melhores filmes de todos os tempos. A cada dez anos, a revista retoma a pesquisa.
Mais do que um interesse em qual seria “o melhor” – afinal, com quais critérios avaliar isso e a que exatamente serve essa pergunta? –, a pesquisa funciona como uma espécie de termômetro da opinião crítica ao redor do mundo e da forma como ela se modula através dos tempos. O primeiro vencedor, na pesquisa de 1952, foi Ladrões de bicicleta, de Vittorio de Sica. Nas quatro edições seguintes, de 1962 a 2002, Cidadão Kane, de Orson Welles ficou no topo, desbancado em 2012 por Um corpo que cai, de Alfred Hitchcock. Em 2022, pela primeira vez em 70 anos, um filme dirigido por uma mulher alçou essa posição: Jeanne Dielman, de Chantal Akerman. Embora nunca tenha deixado de ser discutido, o filme de Chantal retornou com mais força à pauta da cinefilia e ganhou novas exibições ao redor do mundo.
Começando por Jeanne Dielman, projetado em cópia restaurada, o Cinema do IMS Poços exibirá mês a mês os filmes que alçaram o topo dessa lista, sempre nas melhores cópias de exibição disponíveis.
Mais informações sobre a pesquisa da revista Sight and Sound (em inglês).
Jeanne Dielman
Jeanne Dielman, 23, quai du Commerce, 1080 Bruxelles
Chantal Akerman | Bélgica | 1975, 200', restauração 2K, DCP (Fondation Chantal Akerman) | Classificação indicativa: 16 anos
Um nome e um endereço são o título original do filme: Jeanne Dielman, 23, quai du Commerce, 1080 Bruxelles. Em suas quase três horas e meia de duração, o filme de Chantal encena meticulosamente três dias na rotina de uma dona de casa de meia-idade, viúva, que mora com o filho e se sustenta pela prostituição. Dielman arruma as camas, prepara o jantar para o filho, descasca batatas.
"Compreendi a importância do filme muitos meses depois de terminá-lo” – comenta a diretora em depoimento fornecido pela Chantal Akerman Foundation. “No início, pensei que estava apenas contando três dias na vida de uma mulher, depois percebi que era um filme sobre a ocupação do tempo, sobre a angústia: fazer coisas para não pensar no problema fundamental, o de ser."
Em uma extensa matéria publicada no New York Times em 31 de julho de 2016, Delphine Seyrig, que interpreta a protagonista de Jeanne Dielman, comenta seu entusiasmo com o projeto: “O filme olha para a mulher de uma forma amorosa e generosa enquanto ela faz as coisas que tem de fazer todos os dias – a maneira como ela cozinha, a maneira como fica de pé diante da pia. Acabou sendo bastante insuportável de assistir. Ninguém nunca teve que assistir a três horas e meia de uma dona de casa antes. É um filme muito importante."
Jeanne Dielman será exibido em DCP, na versão restaurada pela Cinemateca Real da Bélgica a partir dos negativos originais do filme.
Reportagem do New York Times disponível para leitura (na íntegra, em inglês).
Programação
IMS Poços
24/3, domingo, 17h
Um corpo que cai
Vertigo
Alfred Hitchcock | EUA | 1958, 128’, DCP (Park Circus) | Classificação indicativa: 14 anos
Na trama, James Stewart é um detetive aposentado que tem medo de altura. Ele aceita o pedido de um amigo para vigiar sua mulher, interpretada por Kim Novak, para saber se ela o está traindo. O detetive, no entanto, desenvolve por ela uma obsessão e revisita traumas passados.
Em uma longa entrevista ao cineasta Peter Bogdanovich, Hitchcock comenta o seu processo de trabalho com atores e atrizes: “Eu não os dirijo. Falo com eles e explico o que a cena representa, qual é o objetivo, por que eles estão fazendo certas coisas – porque eles se ligam ao argumento, e não à cena. A cena se relaciona com a história, e aquele momento faz isto ou aquilo pela história. Como tentei explicar a Kim Novak em Um corpo que cai: ‘Você está mostrando um monte de emoções no rosto. Não quero nada disso. Quero que o seu rosto mostre apenas aquilo que queremos contar ao público – aquilo em que você está pensando.’ Disse-lhe: ‘Deixe-me explicar. Se você mostrar muitas emoções redundantes no rosto, é como pegar uma folha de papel e escrever em toda ela – encher o papel com coisas escritas. Mas você quer escrever uma frase para que alguém leia. Se há muitas coisas escritas, o público não consegue ler. É muito mais fácil ler se a folha de papel estiver vazia. É assim que o seu rosto deve estar quando precisarmos mostrar uma expressão.’”
Depoimento extraído do catálogo da mostra Alfred Hitchcock, do CCBB.
Programação
IMS Poços
12/5, domingo, 16h
Cidadão Kane
Citizen Kane
Orson Welles | EUA | 1941, 119’, DCP (Park Circus) | Classificação indicativa: 10 anos
Aos 26 anos, Orson Welles dirigiu e protagonizou seu primeiro longa-metragem. O personagem principal, Charles Foster Kane, é um magnata da indústria editorial, possivelmente inspirado em William Randolph Hearst. “Rosebud” é o mistério do filme, a última palavra dita pelo empresário, que se torna a primeira pista em uma investigação jornalística sobre a vida desse personagem.
No livro O cinema no século, uma compilação de artigos de Paulo Emílio Salles Gomes editada por Carlos Augusto Calil, Cidadão Kane e a obra de Orson Welles são retomados diversas vezes.
Em 1958, no texto “Ainda o Cidadão Kane”, Paulo Emílio reflete sobre sua relação com a obra ao longo dos anos e também sobre o impacto dela em novas gerações: “Na medida em que me foi dado observar, tanto no Rio como aqui, para as novas gerações interessadas nas coisas do cinema, a tomada de contato com a primeira fita de Orson Welles foi uma experiência reveladora. Aos olhos dos jovens, a carga de inovações contida em Cidadão Kane só foi parcialmente integrada no cinema que lhe sucedeu, e a fita continua a desafiar, pela sua modernidade, a produção mais recente.”
Uma análise mais técnica e bastante detalhada foi publicada no ano de lançamento do filme, 1941, no artigo chamado “Citizen Kane”, onde Paulo Emílio esmiúça diversos aspectos da montagem, da fotografia e do som. “A música ajuda muito a ligação de certas cenas e imagens, e também o aparecimento de alguns temas. Mas nunca é fundamental: está sempre num plano acessório. Já em relação ao som, tudo é diferente. O som tem, na realidade, uma grande importância em Citizen Kane, e é frequentemente inseparável da imagem. Vimos acima exemplos de ligação de imagens por sons e frases. As frases faladas têm, ali, um valor de som. Vejamos agora a imagem-som em Citizen Kane. A maior de todo o filme é aquela em que a voz de Susan Alexander transforma-se num som que se extingue com a imagem de uma luz se apagando. Esse momento e a combinação da imagem do trenó abandonado na neve com o som do apito do trem demonstram claramente como Pudóvkin estava certo ao dizer que a imagem e o som só se fundem quando não coincidem. Só do conflito assincrônico entre a imagem e o som poderá sair a imagem-som. Em Citizen Kane Orson Welles trilhou timidamente esse caminho. Mas, com o instinto de cinema que possui, não pode ter deixado de sentir sua extraordinária fecundidade.
Para se ver que Orson Welles é além do mais um diretor (aliás, o simples fato de se dizer que Orson Welles é um bom cineasta deixa claro que tem de ser cenarista [roteirista], montador e diretor, pelo menos), basta observar-se o que conseguiu com ele próprio e com os Mercury Actors, todos bons, mas vindo todos, é preciso que se não esqueça, do teatro e do rádio".
Programação
IMS Poços
16/6, domingo, 16h
IMS POÇOS
24/3/2024, domingo
17h - Jeanne Dielman
IMS POÇOS
12/5/2024, domingo
16h - Um corpo que cai
IMS POÇOS
16/6/2024, domingo
16h - Cidadão Kane
Vendas
Os ingressos do cinema podem ser adquiridos online ou na bilheteria do centro cultural, mais informações abaixo.
Meia-entrada
Com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública, estudantes, crianças de 3 a 12 anos, pessoas com deficiência, portadores de Identidade Jovem e maiores de 60 anos.
Cliente Itaú
Desconto de 50% para o titular ao comprar o ingresso com o cartão Itaú (crédito ou débito). Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala.
Devolução de ingressos
Em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos e por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site.
IMS Poços
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Bilheteria: de terça a sexta, das 13h às 19h. Sábados e domingos, das 9h às 19h, na recepção do IMS Poços.
Os ingressos para as sessões são vendidos na recepção do IMS Poços e pelo site ingresso.com. A venda é mensal e os ingressos são liberados no primeiro dia de cada mês. Os preços variam de acordo com o filme ou a mostra.
Não é permitido o consumo de bebidas e alimentos na sala de cinema.