Tudo isso desfilando em fotos e desenhos, e no texto preciso de Augusto Carlos da Silva Telles em seu Atlas dos Monumentos Históricos e Artísticos do Brasil, uma dessas obras que ensinam a conhecer e amar uma pedra lavrada, um arabesco, um painel, um azulejo e tudo que eles podem contar do espírito criador do homem na intenção de dar beleza e dignidade à vida (função primeira da arte). 1
Neste trecho, veiculado pelo Jornal do Brasil em meados da década de 1970, o escritor Carlos Drummond de Andrade apresenta o Atlas dos Monumentos Históricos e Artísticos do Brasil. O livro, que atualmente é considerado obra de referência, havia acabado de ser lançado com selo do Ministério da Educação e Cultura 2.
Naquele momento, o autor da publicação, Augusto Carlos da Silva Telles (1923-2012), mais conhecido como Silva Telles, já era importante referência no âmbito da arquitetura e patrimônio brasileiros. Arquiteto de formação, iniciou sua carreira na primeira metade da década de 1950 como professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – FAU/ UFRJ, profissão na qual atuou por mais de 20 anos.
Em 1957, passou a integrar o quadro do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), no qual ocupou diferentes cargos ao longo do tempo. Inicialmente, assumiu a função de consultor técnico e, ao final da década de 1970, tornou-se titular da Diretoria de Tombamento e Conservação. Em 1982, passou a ser membro do Conselho Estadual de Tombamento do Rio de Janeiro, assembleia que presidiu de 1994 a 2006. Entre 1988 e 1989, dirigiu a Fundação Pró-Memória 3.
A referida coleção fotográfica está depositada no Instituto Moreira Salles (IMS) desde junho de 2002, quando Silva Telles, então conselheiro do Conselho Consultivo da instituição, efetivou sua doação. São mais de 5.600 fotografias capturadas no Brasil – onde fez registros em 21 estados –, e em países como França, Portugal, República Dominicana, Cuba, Paraguai e Peru. Elas retratam basicamente edificações, seu entorno e detalhes. As igrejas, prédios governamentais, museus, sítios arqueológicos, praças e estátuas são os protagonistas de seus registros. Toda a coleção foi digitalizada, catalogada e está sendo gradativamente disponibilizada para consulta no banco de imagens on-line do IMS.
A partir de pesquisas em sites oficiais e publicações sobre arquitetura e patrimônio, foi possível identificar e catalogar as fotos de sua coleção. Nesse sentido, no caso do Brasil, foram essenciais como fontes o já mencionado Atlas dos Monumentos Históricos e Artísticos do Brasil, onde são encontradas diversas fotos do próprio Augusto Silva Telles – e a página do Acervo Digital do Iphan. Para o trabalho com fotos de outros países, os sites ligados ao patrimônio foram importantes. A título de ilustração, podemos citar as diversas fotos produzidas em Portugal – um dos maiores conjuntos da coleção realizados no exterior –, muitas delas identificadas a partir do acesso ao portal do patrimônio cultural português 4.
O trabalho de catalogação no banco de imagens Cumulus foi, portanto, resultado de um vasto trabalho de pesquisa, que passou pela atribuição de título da imagem, data, local, dimensão e pela sua indexação (a partir do uso de palavras-chave). Além disso, muitas dessas imagens foram contextualizadas por meio de resumos que visavam a agregar informações consideradas relevantes à coleção, e acabaram por evidenciar alguns nomes ligados à arquitetura brasileira e mundial como o arquiteto-escultor Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho; o pintor e decorador Manuel da Costa Athaíde; o arquiteto italiano Antônio José Landi; o arquiteto francês, que trabalhou com o Imperador Pedro I, Pedro José Pezerat; e o arquiteto Lúcio Costa, dentre outros.
O objetivo desse texto foi lançar luz, de forma breve, para a trajetória de Augusto Silva Telles, explicitando sua importância na valorização e consolidação do patrimônio material brasileiro, seja através de suas publicações, seja através de sua própria atuação no Iphan. A expectativa é que com a difusão de sua coleção, ainda pouco conhecida, as fotografias de sua autoria possam ser utilizadas como fonte para pesquisas e trabalhos ligados às áreas de arquitetura e bens culturais em geral.
1. Jornal do Brasil, 17/05/1975.
2. Naquele contexto, a publicação atendia ao que havia sido pactuado no chamado Compromisso de Brasília (1970), onde diferentes instâncias ligadas ao patrimônio cultural dos âmbitos nacional, estadual e municipal se reuniram a fim de discutir medidas de preservação e difusão dos bens culturais brasileiros. (COSTA, 2016, p.158).
3. A Fundação Pró-Memória foi criada em 1979, como um braço executivo da então Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan), antigo Iphan. Ver mais em http://portal.iphan.gov.br/dicionarioPatrimonioCultural/detalhes/53/fundacao-nacional-pro-memoria-1979-1990, acesso em 30 de março de 2020.
4. Ver http://www.patrimoniocultural.gov.pt. Acesso em 13 de fevereiro de 2020.
Referência bibliográfica
COSTA, Eduardo Augusto. Uma trajetória do Arquivo Fotográfico do Iphan: mudanças discursivas entre os anos 1970 e 1980. Anais do Museu Paulista. v. 24. n.1. Jan.-Abr. 2016.
RESENDE, Maria Beatriz; GRIECO, Bettina; TEIXEIRA, Luciano; THOMPSON, Analucia. “Fundação Nacional Pró-Memória 1979-1990” (verbete). In: Dicionário IPHAN de Patrimônio Cultural. Rio de Janeiro, Brasília: IPHAN/DAF/Copedoc, 2015.
TELLES, Augusto Carlos da Silva. Atlas dos Monumentos Históricos e Artísticos do Brasil. 2a ed. Rio de Janeiro: MEC; SEAC; FENAME, 1980 [1975].
THOMPSON, Analucia (org.). “Entrevista com Augusto Carlos da Silva Telles”. In: Memórias do Patrimônio. Rio de Janeiro: IPHAN/DAF/Copedoc, 2010.
Vanessa Matheus Cavalcante é doutoranda em História e atua no Núcleo de Catalogação e Indexação do IMS.