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Negritude em fotolivros

22 de novembro de 2021

Garimpados no acervo da Biblioteca de Fotografia do IMS Paulista, os cinco livros abaixo foram escolhidos pela fotógrafa Cat Tenório, diretora criativa da agência MOOC, para serem divulgados em uma ação no instagram que celebra o Mês da Consciência Negra. A ocupação com curadoria da MOOC nasceu de uma parceria entre o IMS e a Feira Preta.


Negros indícios: performance vídeo fotografia, organizado por Roberto Conduru

“Negros indícios” reúne a produção contemporânea de 12 artistas afrodescendentes de diferentes regiões do país que trabalham no campo da performance. Com curadoria do professor de história e teoria da arte Roberto Conduru, a mostra busca lançar luz sobre artistas, temas e práticas que vêm ganhando mais ressonância no sistema da arte e explorar todas as modalidades de conjugação de performance, vídeo e fotografia: performances, registros de performance em vídeo e fotografia, fotoperformances, vídeoperformances e seus desdobramentos.

Para contrapor o esquecimento histórico, o racismo e a segregação, os artistas Antônio Obá, Ayrson Heráclito, Caetano Dias, Dalton Paula, João Manoel Feliciano, Moisés Patrício, Musa Michelle Mattiuzzi, Priscila Rezende, Renata Felinto, Rommulo Vieira Conceição, Rubiane Maia e Tiago Sant’Ana apresentam obras que refletem a capacidade de usar as adversidades como força de criação, resistência e luta. Os trabalhos também evidenciam o amadurecimento da discussão sobre as identidades e negritudes no Brasil – marcada, nos últimos anos, pela pluralidade e pelo crescente protagonismo dos artistas afrodescendentes.

Pelas obras dos artistas presentes neste livro, sinto que nos convidam a participar de uma luta que não pode ser apenas deles e delas, mas de quem almeja viver em um mundo justo, igualitário e fraternal.

 

 

An Illustrated Bio-bibliography of Black Photographers: 1940-1988, de Deborah Willis

A fotografia como recurso documental e forma de arte remonta ao século XIX. Quase desde a origem dessa técnica revolucionária de reprodução, os negros têm figurado de forma proeminente em sua história – como documentaristas, jornalistas, artistas, fotógrafos de estúdio e sujeitos. Um homem de cor livre, Jules Lion, introduziu o daguerreótipo em Nova Orleans já em 1840. Os negros apareciam frequentemente como temas e objetos de fotógrafos do século XIX – tanto negros quanto brancos – na África e entre os norte-americanos. Durante as primeiras quatro décadas do século XX, os fotógrafos negros fizeram contribuições significativas para preservar aspectos da história e da cultura afro-americana através do meio fotográfico.

Em seu primeiro livro, An Illustrated Bio-Bibliography, Deborah Willis resgatou do esquecimento muitos dos fotógrafos negros norte-americanos pioneiros do século XIX e início do século XX. Os 65 indivíduos incluídos na obra trabalharam durante os primeiros cem anos de desenvolvimento do meio, capturando aspectos pungentes dos mundos rural e urbano em que a comunidade negra estadunidense atingiu a maioridade.

Produto de mais de dez anos de pesquisas, este trabalho tornou-se um recurso essencial para o estudo da vida e da obra desses negros pioneiros da fotografia. Nele encontram-se informações biográficas básicas sobre os fotógrafos selecionados, fontes de informações sobre suas coleções, exposições, publicações e amostras representativas de seus trabalhos.

 

Gordon Parks: The New Tide Early Work, 1940-1950, organizado por Philip Brookman

Gordon Parks fez parte do que o autor Richard Wright chamou de “a nova maré” de afro-americanos que lutavam por respeito e igualdade racial na década de 1940. Organizado pela National Gallery of Art de Washington, em colaboração com a Gordon Parks Foundation, este volume explora os primeiros anos da carreira de Parks como um fotógrafo influente que capturou a essência do movimento de direitos civis, além de quebrar barreiras para afro-americanos. De suas fotos de moda a suas representações cuidadosas da vida americana, Parks usou a câmera como ferramenta para proclamar o valor de uma comunidade norte-americana construída com base na liberdade e na igualdade.

Com foco em novas pesquisas e acesso a fotos esquecidas, o livro documenta a importância desses anos na formação da visão apaixonada de Gordon Parks. Durante os anos 1940, as ambições fotográficas de Parks cresceram para expressar uma compreensão profunda de suas experiências culturais e políticas. Desde as primeiras fotografias que publicou em Saint Paul, Minnesota, passando por sua relação com o Chicago Black Renaissance até sua orientação com Roy Stryker e seu trabalho inovador para influentes revistas de fotografia dos EUA – incluindo Ebony e Life.

Por meio de cerca de 150 fotografias, bem como revistas, jornais, panfletos e livros raros, o livro oferece uma visão ampla e íntima de como este pioneiro artista afro-americano se tornou um dos fotógrafos mais influentes de sua época.

 

Negros estrangeiros: os escravos libertos e sua volta à África, de Manuela Carneiro da Cunha

A nova edição, revista e ampliada, deste livro retoma um clássico sobre a história dos libertos no Brasil e das relações Brasil-África no século XIX, bem como uma atualíssima discussão antropológica sobre o conceito de identidade étnica. Tratou-se igualmente de um marco nos estudos sobre a alforria e a situação daqueles que, uma vez superada a escravidão, enfrentavam os limites que a sociedade impunha ao exercício da liberdade alcançada.

Ao debruçar-se sobre as trajetórias de africanos que, uma vez libertos e de volta ao seu continente de origem no século XIX, passaram a identificar-se como brasileiros, procurando manter o português como sua língua e o catolicismo como sua religião, além do calendário litúrgico-festivo brasileiro, Manuela Carneiro da Cunha deslinda um rico e complexo sistema de formação de identidade étnica.

Demonstra que essa criação não pode ser entendida fora de seu contexto histórico e das relações dos grupos que criam essa identidade com outros sujeitos sociais. E o faz com base em cuidadosa pesquisa com utilização de fontes de época, além de entrevistas com descendentes da comunidade de brasileiros na Nigéria.

O livro foi muito enriquecido pela inclusão de belas imagens de época feitas no Brasil e na África, além de fotografias de Pierre Verger e da coleção pessoal da autora, referentes à comunidade de brasileiros na Nigéria no século XX.

 

Negros no estúdio do fotógrafo: Brasil, segunda metade do século XIX, de Sandra Sofia Machado Koutsoukos

O livro traz um estudo das representações e autorrepresentações de pessoas negras livres, forras e escravizadas produzidas em estúdios de fotografia no Brasil da segunda metade do século XIX. A autora argumenta que uma pessoa negra livre, ou forra, que aparece naquelas fotos vestida à moda europeia de então, não o fazia devido à sua suposta “aculturação”, mas como estratégia para se proteger e tentar se fazer aceita por uma sociedade na qual o preconceito racial e a discriminação dominavam.

As fotos dos escravizados são estudadas em três categorias: na primeira, fotos de escravizados domésticos que foram levados aos estúdios por seus senhores, os quais queriam aquelas fotos nos seus álbuns de família; na segunda, fotos que foram exploradas na chave do “exótico” e vendidas como souvenir a estrangeiros; e na terceira, fotos etnográficas que foram produzidas para servirem de suporte a teorias racistas então em voga.

Por último, o livro explora fotos de presos em dois álbuns da “Galeria de condenados”, traçando o caminho da feitura dos álbuns (o próprio fotógrafo era um dos detentos) e os motivos para a sua montagem.

Além de estudar os diferentes sentidos, os usos e circulação daquelas fotos, a autora tenta perceber os modos pelos quais as pessoas negras nelas retratadas influenciavam a composição de suas próprias imagens.

Cat Tenório é fotógrafa e diretora criativa da agência MOOC, da qual é uma das fundadoras.