A última edição da Sessão Mutual Films de 2025 apresenta um diálogo entre obras de dois cineastas que acreditavam no poder da imagem de revelar a alma humana. O dinamarquês Carl Theodor Dreyer (1889-1968) foi reverenciado e odiado por gerações de cinéfilos por seu compromisso rigoroso com seus princípios e sua crença no cinema como uma arte absoluta. A protagonista do seu último longa-metragem, Gertrud (1964) (interpretada por Nina Pens Rode), espelha o cineasta ao procurar a mais perfeita realização do amor ao longo de diversos relacionamentos. Já a cineasta e artista visual alemã Dore O. (1946-2022) construiu uma imagem potente de si mesma através de seus curtas-metragens experimentais feitos entre os anos 1960 e 1970, que funcionam tanto como autorretratos enigmáticos quanto como representações da busca pela compreensão do lugar do ser humano no mundo. Vão ser exibidos cinco filmes de Dore O., entre eles obras celebradas, como Alaska (1968), Lawale (1969) e Kaldalon (1971), todos em cópias recém-restauradas. E, além de Gertrud, a mostra conta com um dos curtas mais icônicos de Dreyer, uma mistura de propaganda e ficção chamada A travessia (1948). Os filmes de Dore O. são apresentados no IMS Paulista com o apoio do Goethe-Institut São Paulo. A exibição do dia 3 contará com uma introdução presencial da crítica e professora Lorenna Montenegro, e a exibição do dia 4, com uma introdução presencial da curadora e pesquisadora de cinema experimental Roberta Pedrosa.
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Amor omnia: Dreyer e Dore O. - por Aaron Cutler e Mariana Shellard ►
Sessões especiais
IMS PAULISTA
Programa 1: Gertrud
3/12/2025, quarta, 19h10
Sessão apresentada por Lorenna Montenegro
Programa 2: Filmes de Dore O.
4/12/2025, quinta, 19h10
Sessão apresentada por Roberta Pedrosa

Filmes
Classificação indicativa da sessão: 14 anos
Stern des Méliès [Estrela de Méliès]
Dore O. | Alemanha Ocidental | 1982, 12’, DCP (Deutsche Kinemathek), cópia restaurada | Classificação indicativa: 14 anos
Gertrud
Carl Theodor Dreyer | Dinamarca | 1964, 118’, DCP (Danske Filminstitut/Palladium), cópia restaurada | Classificação indicativa: 14 anos
O último dos 14 longas-metragens dirigidos pelo cineasta dinamarquês Carl Theodor Dreyer se dedica à personagem Gertrud (interpretada por Nina Pens Rode), uma ex-cantora de ópera que largou a sua profissão para se casar com o frio servidor público Gustav Kanning (Bendt Rothe). Com o desgaste de seu casamento, ela pede o divórcio e se entrega ao amor por Erland Jansson (Baard Owe), um jovem compositor e pianista com um futuro promissor. Acompanhamos os diferentes encontros de Gertrud com os dois e com outras figuras de seu presente e passado, entre elas o grande poeta romântico Gabriel Lidman (Ebbe Rode) e o psicanalista Axel Nygren (Axel Strøbye). Diferentemente dos homens obcecados por suas profissões, a vocação principal de Gertrud é amar. Ela procura em seu par a mesma dedicação ao amor integral (“amor omnia”) que carrega consigo e está disposta a oferecer.
O filme Gertrud baseia-se em uma peça de mesmo nome de 1906 do dramaturgo sueco Hjalmar Söderberg e reflete o sentimento de Dreyer em relação a sua própria obra cinematográfica, que contou com exigentes obras-primas realizadas ao longo de mais de 40 anos, como A queda do tirano (Du skal ære din hustru, 1925), A paixão de Joana d’Arc (La Passion de Jeanne d’Arc, 1928), O vampiro (Vampyr, 1932) e Dias de ira (Vredens dag, 1943). Por anos, Dreyer buscou, sem sucesso, adaptar a peça para o cinema. Quando finalmente conseguiu, levou ao extremo um estilo teatral já desenvolvido em seus filmes anteriores, com longos planos, elegantes movimentos de câmera e um foco intenso na dicção dos atores. Acrescentou elementos à peça, como um novo epílogo e cartelas com versos (escritos pela poetisa dinamarquesa Grethe Risbjerg Thomsen), que aparecem de forma periódica para refletir o estado interior de Gertrud, e simplificou elementos cinematográficos, como cenografia e diálogos, em busca de uma forma mais concisa. E, para atribuir à história um caráter de tragédia clássica – em contraste com o naturalismo da peça –, concentrou-se nas figuras dos personagens, dando-lhes o que chamou de um aspecto escultural.
Gertrud teve uma recepção inicial insípida, porém logo foi abraçado por gerações jovens e cinéfilas de artistas, como a dos cineastas da Nouvelle Vague, na França, e a dos cineastas experimentais nos Estados Unidos. O cineasta e jornalista lituano-norte-americano Jonas Mekas escreveu, em outubro de 1965 para a Village Voice, logo após as exibições de Gertrud no Festival de Cinema de Nova York: “Embora mantenha uma atitude objetiva em relação aos seus personagens, como um autor deve fazer, Dreyer se identifica com Gertrud. Ele disse que usou o mesmo diretor de fotografia (Henning Bendtsen) para Gertrud e [seu filme anterior] A palavra (Ordet, 1955) – é por isso que ambos os filmes são iluminados com a mesma luz espiritual”.
A exibição no IMS Paulista da cópia restaurada de Gertrud no dia 3 de dezembro vai contar com uma introdução presencial da crítica, professora e roteirista Lorenna Montenegro. Ambas as exibições de Gertrud também contarão com um curta-metragem restaurado da cineasta alemã experimental Dore O. (uma admiradora de Dreyer). O filme Stern des Méliès homenageia o nascimento do cinema com truques e trejeitos que mimetizam os filmes fantásticos do pioneiro francês George Méliès (1861-1938), especialmente A conquista do polo (À la conquête du pôle, 1912), uma adaptação de Júlio Verne que é frequentemente visto como o último grande filme do cineasta. Em sua homenagem, Dore O. cria uma fantasia cubista com sobreposições e jogos de luz e sombra, que também são característicos de seus próprios filmes. Dore O. disse: “A realidade do filme é a imaginação do espectador. O meu Polo Norte fica na região de Ruhr”.
PROGRAMAÇÃO
IMS Paulista
3/12/2025, quarta, 19h10
Sessão apresentada por Lorenna Montenegro
20/12/2025, sábado, 17h20
Lorenna Montenegro é crítica de cinema, roteirista, curadora, pesquisadora acadêmica, jornalista cultural e professora. Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação Audiovisual na Universidade Anhembi Morumbi (UAM). Integra o Coletivo Elviras, a Abra e a Abraccine, além de ser diretoria executiva do Forcine. Cursou produção audiovisual na PUCRS e tem especialização em Cinema e Linguagem Audiovisual na Estácio. Integra a comissão de seleção de curtas-metragens do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Dá aulas de roteiro na AIC-SP. Coordena o Festival As Amazonas do Cinema. Ministrou cursos para entidades como a Cinemateca Brasileira e o Sesc sobre o cinema clássico narrativo, a história do cinema através de filmes dirigidos por mulheres e as obras de cineastas canônicos, como Ida Lupino, Nicholas Ray e Samuel Fuller.
Classificação indicativa da sessão: 14 anos
Blonde Barbarei [Barbarismo loiro]
Dore O. | Alemanha Ocidental | 1972, 24’, DCP (Deutsche Kinemathek), restauração 2K | Classificação indicativa: 14 anos
Kaldalon
Dore O. | Alemanha Ocidental | 1971, 45’, DCP (Deutsche Kinemathek), restauração 2K | Classificação indicativa: 14 anos
Lawale
Dore O. | Alemanha Ocidental | 1969, 29’, DCP (Deutsche Kinemathek), restauração 2K | Classificação indicativa: 14 anos
Alaska [Alasca]
Dore O. | Alemanha Ocidental | 1968, 18’, DCP (Deutsche Kinemathek), restauração 2K | Classificação indicativa: 14 anos
A travessia
De nåede færgen
Carl Theodor Dreyer | Dinamarca | 1948, 11’, DCP (Danske Filminstitut), cópia restaurada | Classificação indicativa: 14 anos
Dore Oberloskamp nasceu em 1946, um ano após o término da Segunda Guerra Mundial, no vale do Ruhr, uma região industrial da Alemanha. Sob o nome artístico de Dore O., ela fez parte de uma geração de artistas que nasceu em uma Alemanha destruída pela guerra, e que presenciou uma rápida reconstrução nacional e muitas mudanças políticas. Apesar de boa parte de seus colegas do cinema experimental alemão (cujos diretores mais importantes incluíram seu marido e colaborador frequente Werner Nekes) dedicarem-se ao cinema político e marginal das guerrilhas, Dore O. voltou seu olhar para si mesma. A partir de 1968, com seu primeiro filme solo, Alaska, ela criou um cinema subjetivo em suas explorações de questões da psique humana, com críticas sociais sutis e muito pessoais, de um lado, e, de outro, materialmente experimental, com uso de sobreposições, edição na câmera, reciclagem de suas próprias imagens e de found footage, incluindo até o uso de fotoquímicos utilizados na indústria hospitalar. Ao longo dos seus mais de 30 anos de produção cinematográfica, que resultou na realização de 17 curtas e médias-metragens, Dore O. tomou como forte referência o protocinema, e inclusive desenvolveu obras de cinema expandido com esculturas e aparatos que apresentou isoladamente ou junto a seus filmes.
O programa dedicado a Dore O. que passará no IMS Paulista conta com os primeiros quatro filmes dirigidos exclusivamente pela cineasta. Os filmes foram restaurados entre 2018 e 2021 em 2K pela Deutsche Kinemathek, em Berlim, a partir dos seus melhores materiais existentes em 16 mm e sob a supervisão da diretora, que faleceu logo em seguida, em 2022. Segundo Dore O: “Meus filmes sempre têm uma história. Não é necessário que outras pessoas reconheçam a história – é apenas para mim.” Ela também comentou sobre os filmes da sessão:
Blonde Barbarei, um passeio pela memória recente da Alemanha: “Um filme para a libertação da sensualidade. Um filme contra o hospitalismo da sociedade. O olhar se cansou tanto de passar, de deslizar por barras, que nada mais consegue segurá-lo”.
Kaldalon, uma invocação fantasmagórica de uma viagem recente à Islândia inspirada no romance O monte Análogo (Le Mont Analogue, 1952), do francês René Daumal: “Um filme de aventura não euclidiano, ambiguamente mutilado e transfigurado”.
Lawale, um vislumbre teatralizado de uma família enclausurada cujo nome funde as palavras em alemão para “lava” e “baleia”: “Imagens de sonhos e pesadelos da burguesia. A memória é uma esperança cruel sem despertar.”
Alaska, no qual uma jovem corre sem destino em uma praia deserta: “Um filme sobre emigração: um sonho sobre eu mesma, a consequência do ato com a sociedade”.
Os filmes de Dore O. são exibidos no IMS Paulista com o apoio do Goethe-Institut São Paulo. A exibição no dia 4 vai contar com uma introdução presencial da curadora e pesquisadora de cinema experimental Roberta Pedrosa. E ambas as exibições contarão com um curta-metragem dirigido pelo dinamarquês Carl Theodor Dreyer, um cineasta admirado por Dore O. A travessia (cujo nome original se traduz como “Eles pegaram a balsa”) foi um dos filmes didáticos que Dreyer fez sob comissão nos anos entre as realizações dos seus longas de ficção Dias de ira e A palavra. Ele se inspirou no conto mítico de mesmo nome, escrito pelo então recém-vencedor do prêmio Nobel de Literatura Johannes V. Jensen, e foi realizado para o Conselho Dinamarquês para a Segurança Rodoviária, para alertar motoristas sobre o perigo de dirigir em alta velocidade. O filme acompanha um casal em uma moto (cujos membros são interpretados pelo casal Joseph e Kamma Koch) que atravessa uma região rural para pegar a balsa para a cidade de Nyborg. Conforme dirigem rapidamente, eles percebem ao seu lado um misterioso carro preto, cujo motorista deu-lhes um outro destino.
PROGRAMAÇÃO
IMS Paulista
4/12/2025, quinta, 19h10
Sessão apresentada por Roberta Pedrosa
13/12/2025, sábado, 17h
Roberta Pedrosa vive e trabalha em São Paulo. É curadora, pesquisadora e artista, com foco em cinema e artes visuais. É curadora de curtas-metragens do Festival Ecrã (Rio de Janeiro) e Mestra em História, Crítica e Teoria da Arte pela Universidade de São Paulo (ECA-USP). Escreve sobre arte e cinema, tendo contribuído com publicações como Revista Limite (Brasil), El Cine Probablemente (México), Photogénie (Bélgica) e para instituições como a Cinemateca do MAM-RJ. Pesquisou e programou filmes de diversas diretoras importantes ligadas ao cinema experimental, entre elas Chantal Akerman e Narcisa Hirsch.
IMS PAULISTA
3/12/2025, quarta
19h10 - Programa 1: Gertrud
Sessão apresentada por Lorenna Montenegro
4/12/2025, quinta
19h10 - Programa 2: Filmes de Dore O.
Sessão apresentada por Roberta Pedrosa
13/12/2025, sábado
17h - Programa 2: Filmes de Dore O.
20/12/2025, sábado
17h20 - Programa 1: Gertrud
Vendas
Os ingressos do cinema podem ser adquiridos online ou na bilheteria do centro cultural, mais informações abaixo.
Meia-entrada
Com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública, estudantes, crianças de 3 a 12 anos, pessoas com deficiência, portadores de Identidade Jovem e maiores de 60 anos.
Cliente Itaú
Desconto de 50% para o titular ao comprar o ingresso com o cartão Itaú (crédito ou débito). Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala.
Devolução de ingressos
Em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos e por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site.
IMS Paulista
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Bilheteria: de terça a domingo, das 12h até o início da última sessão de cinema do dia, na Praça, no 5º andar.
Os ingressos para as sessões são vendidos na recepção do IMS Paulista e pelo site ingresso.com. A venda é mensal e os ingressos são liberados no primeiro dia de cada mês.
Sessão Mutual Films é um evento bimestral com o propósito de criar diálogos entre as várias faces do meio cinematográfico, trazendo para o público, sempre que possível, filmes, restaurações e eventos inéditos em sessões duplas.
