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Sessão Mutual Films

O forasteiro Sterling Hayden: Johnny Guitar e Farol do caos

O ator norte-americano Sterling Hayden (1916-1986) é conhecido hoje por suas colaborações com cineastas como Robert Altman, John Huston e Stanley Kubrick. Em 1951, a estrela hollywoodiana, herói de guerra e velejador foi intimado a depor publicamente no Comitê de Atividades Antiamericanas (HUAC), em um período marcado por perseguições políticas contra membros da esquerda norte-americana, inclusive diversos diretores, atores, roteiristas e técnicos que foram banidos dos estúdios de Hollywood. A Sessão Mutual Films de fevereiro de 2025 traz dois filmes que fazem referência a esse período através da figura de Hayden, que havia se associado ao Partido Comunista americano por alguns meses após ter lutado junto aos Partidários iugoslavos durante a Segunda Guerra Mundial e decidiu denunciar seus colegas de cinema ao comitê para não perder a guarda de seus filhos. O atípico e icônico faroeste Johnny Guitar (1954), dirigido por Nicholas Ray (1911-1979), que traz Hayden no papel de um cowboy em busca de uma nova vida, passará no IMS Paulista em uma cópia recém-restaurada em 4K. O retrato documental de Hayden Farol do caos (Leuchtturm des Chaos, 1983), dos críticos e cineastas alemães Wolf-Eckart Bühler (1945-2020) e Manfred Blank (nascido em 1949), retrata o ator no final de sua vida, morando em uma barcaça na França e amargurando o tormento dos seus atos passados. A exibição de Johnny Guitar no dia 18 será apresentada pelo crítico e curador Paulo Santos Lima, um especialista em estudos autorais de atores hollywoodianos.

A curadoria e produção da Sessão Mutual Films são de Aaron Cutler e Mariana Shellard.

Blog do cinema:
O forasteiro Sterling Hayden: Johnny Guitar + Farol do caos - por Alf Mayer ►


Sessões especiais

IMS PAULISTA

Johnny Guitar
18/2/25, terça, 19h30
Sessão apresentada por Paulo Santos Lima

Farol do caos
19/2/25, quarta, 19h30
Sessão apresentada por Aaron Cutler e Mariana Shellard

Informações sobre todas as exibições ►

Sterling Hayden em cena de Johnny Guitar, de Nicholas Ray

Filmes


Johnny Guitar

Johnny Guitar
Nicholas Ray | EUA | 1954, 110’, DCP, restauração 4K (Park Circus) | Classificação indicativa: 14 anos

O personagem-título do nono longa-metragem de Nicholas Ray foi interpretado por Sterling Hayden no auge da fama do ator. O cowboy que uma vez foi conhecido como Johnny Logan trocou sua arma por uma guitarra e, no início do filme, chega aos confins do Arizona em busca de uma nova vida. Lá, ele se depara com uma figura do seu passado. No único bar e cassino da cidade, à espera da modernização com a promessa da construção da ferrovia, a proprietária Vienna (Joan Crawford, também uma produtora do filme) cuida do que é dela com os colhões de um homem, rodeada de ameaças de uma população local de criadores de gado que via o progresso como uma intimidação a seu estilo de vida puritano. O grupo – liderado de forma vocífera pela banqueira Emma Small (Mercedes McCambridge) – tenta banir Vienna da cidade, ao acusá-la de ficar na companhia do bandido Dancing Kid (Scott Brady), que havia sido acusado falsamente de assassinato. No meio das intrigas que surgem, Vienna alista a ajuda de Johnny – o amor de sua vida, que ela abandonou cinco anos atrás e que agora reencontra com amargura e esperança.

O cineasta norte-americano Ray fez o faroeste Johnny Guitar após realizar os emblemáticos filmes noir Amarga esperança (They Live By Night, 1948), No silêncio da noite (In a Lonely Place, 1950) e Cinzas que queimam (On Dangerous Ground, 1951). Como em muitos dos seus filmes – inclusive no faroeste contemporâneo Paixão de bravo (The Lusty Men, 1952) –, os protagonistas são pessoas feridas e marginalizadas, que buscam refúgio de uma sociedade ameaçadora. E, neste caso, a busca teve dimensões políticas, pois Ray e seus roteiristas Philip Yordan e Ben Maddow vislumbraram a história como uma alegoria para as perseguições anticomunistas então em voga nos Estados Unidos. (Maddow, inclusive, estava na Lista Negra de Hollywood e não recebeu crédito pela sua participação no roteiro do filme.)

Em Johnny Guitar, as forças da lei e do capitalismo são as mais destrutivas, capazes de incitar violência em massa. Enquanto isso, Vienna e Johnny são pessoas que cometem o pecado de valorizar amor e amizade. Crawford (a quem o romance de Roy Chanslor que deu origem ao filme foi dedicado), clássica estrela de Hollywood, preferiu não assumir posições políticas publicamente, apesar de sua formação conservadora. Ela exigiu que Vienna tivesse a força dos protagonistas masculinos dos faroestes e disse para o roteirista Yordan: “Deixe Sterling brincar sozinho no canto”1. Por sua parte, Hayden, um ex-membro do Partido Comunista, publicamente denunciou colegas de Hollywood como comunistas, mas depois continuou a se associar com artistas e causas de esquerda, muitas vezes de forma autocrítica. “Eu não entendo Johnny Guitar”, ele disse em 1982 para os documentaristas alemães mais jovens Manfred Blank e Wolf-Eckart Bühler. “Eu nunca soube o que eu estava fazendo no filme”2.

A crítica norte-americana também não entendeu Johnny Guitar, achando o estilo demasiado florido e a narrativa incompreensível. Porém, o filme foi um sucesso de bilheteria, algo que ajudou Ray posteriormente a fazer Juventude transviada (Rebel without a Cause, 1955) e outros filmes de maior estrutura. Johnny Guitar, realizado no pequeno estúdio Republic Pictures, foi o segundo filme colorido de Ray, e também sua primeira experiência com a janela widescreen, embora o filme tenha circulado durante anos na janela Academy.

A restauração em 4K de Johnny Guitar, que terá sua estreia brasileira no IMS Paulista, apresenta a versão widescreen do filme. A primeira exibição será apresentada pelo crítico, jornalista e historiador de cinema Paulo Santos Lima.

1 Citado em inglês no texto de Jonathan Rosenbaum, Johnny Guitar: The First Existential Western.
2 A fala de Hayden se encontra no documentário de média-metragem de Blank e Bühler, Da âncora, pouse abaixo: um filme estrelado por Sterling Hayden (Vor Anker, Land unter: Ein Film mit Sterling Hayden, 1982), que aparece como um extra na edição em DVD de Farol do caos que foi lançada pela Edition Filmmuseum em 2018.

 

PROGRAMAÇÃO

IMS Paulista
18/2, terça, 19h30
Sessão apresentada por Paulo Santos Lima

23/2, domingo, 17h20


Farol do caos

Leuchtturm des Chaos
Wolf-Eckart Bühler, Manfred Blank | Alemanha Ocidental | 1983, 119’, DCP, cópia restaurada (Museu de Cinema de Munique) | Classificação indicativa: 14 anos

Em sua fortaleza marítima, uma barcaça chamada Farol da Islândia estacionada perto da cidade francesa de Besançon, o ator semiaposentado representa seu último papel como protagonista. Embriagado, meio louco, ele conta suas histórias, suas ideias, conversa com uma equipe de filmagem que, salvo por alguns momentos, não se retrata para a câmera. O homem vive com os fantasmas de seu passado, incapaz de se perdoar por seus atos. “Meu mundo era o mar,” ele diz, “e o mar é penoso.” Os gestos repetitivos das mãos e da voz delatam a loucura, fruto do isolamento e da solidão. Os grandes escritores do mar, como Herman Melville e Robert Louis Stevenson, o acompanham, e passagens de livros são lidas como uma forma de passar o tempo. “Trata-se de um segundo nascimento.” Assim ele descreve o momento atual da sua vida, no qual tenta escrever um livro sobre a sensação de descobrir os veleiros aos 12 anos e perceber a existência de um outro mundo.

Com 65 anos, este ator norte-americano é Sterling Hayden, o emblemático navegador e herói de guerra que ajudou os comunistas iugoslavos durante a Segunda Guerra Mundial, e que, em 1951, denunciou seus colegas de Hollywood como comunistas para o Comitê de Atividades Antiamericanas (HUAC). Segundo a narração do documentário-retrato Farol do caos, os cinéfilos sempre identificaram Hayden com seu papel do ex-pistoleiro romântico em Johnny Guitar, o filme de Nicholas Ray que faz referência explícita àquele período de caça às bruxas e metamorfoseia a realidade em um faroeste. Mas, no momento das filmagens do documentário, quase 30 anos depois, Hayden se parece mais com o personagem do escritor alcoólatra no filme O perigoso adeus (The Long Goodbye, 1973), de Robert Altman: descalço, barbudo, solitário e angustiado, entrando e saindo de um estado de chocante lucidez.

Farol do caos intercala imagens de arquivo e uma narração simples e direta sobre Hayden com as reflexões do ator. Os codiretores do filme, Wolf-Eckart Bühler e Manfred Blank, foram críticos de cinema para a importante revista alemã Filmkritik e colaboraram em uma série de documentários sobre artistas que entraram na Lista Negra da indústria cinematográfica norte-americana sob suspeita de serem comunistas. Eles estavam trabalhando em uma adaptação para o cinema do livro autobiográfico de Hayden, Wanderer [Viajante], de 1963, que aborda o período dos depoimentos do comitê até seu abandono de Hollywood no final da década de 1950, retornando ao mar. Ao encontrar com Hayden para pedir sua autorização para a adaptação cinematográfica (que virou o filme Der Havarist, de Bühler, em 1984), eles se deram conta de que havia um outro filme a ser feito naquele momento.

Farol do caos serve, então, como um registro intenso da semana do encontro. Hayden faleceu de câncer de próstata três anos após o lançamento do filme no Festival Internacional de Cinema de Berlim. Blank teve uma longa carreira subsequente como crítico e cineasta, inclusive em colaboração com artistas como Harun Farocki, Merlyn Solakhan e Straub-Huillet. E Bühler, além de Der Havarist, fez dois filmes potentes sobre o legado da Guerra do Vietnã (Amerasia, de 1985, e Viet Nam!, de 1994) e se dedicou ao gênero de literatura de viagem.

Farol do caos foi restaurado pelo Museu de Cinema de Munique em 2017 a partir dos seus negativos originais em 16 mm. Bühler e Blank fizeram duas versões do filme – uma com narração em inglês e a outra com narração em alemão. Pelo que se sabe, as exibições no IMS Paulista da versão em inglês marcam a estreia brasileira do filme.

 

PROGRAMAÇÃO

IMS Paulista
19/2, quarta, 19h30
Sessão  apresentada por Aaron Cutler e Mariana Shellard

23/2, domingo, 15h


Programação

IMS PAULISTA

18/2/2025, terça
19h30 - Johnny Guitar
Sessão apresentada por Paulo Santos Lima

19/2/2025, quarta
19h30 - Farol do caos
Sessão apresentada por Aaron Cutler e Mariana Shellard

23/2/2025, domingo
15h - Farol do caos
17h20 - Johnny Guitar


Ingressos

Vendas
Os ingressos do cinema podem ser adquiridos online ou na bilheteria do centro cultural, mais informações abaixo.

Meia-entrada
Com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública, estudantes, crianças de 3 a 12 anos, pessoas com deficiência, portadores de Identidade Jovem e maiores de 60 anos.

Cliente Itaú
Desconto de 50% para o titular ao comprar o ingresso com o cartão Itaú (crédito ou débito). Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala.

Devolução de ingressos
Em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos e por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site.


IMS Paulista

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Bilheteria: de terça a domingo, das 12h até o início da última sessão de cinema do dia, na Praça, no 5º andar.

Os ingressos para as sessões são vendidos na recepção do IMS Paulista e pelo site ingresso.com. A venda é mensal e os ingressos são liberados no primeiro dia de cada mês.


Sessão Mutual Films

Sessão Mutual Films é um evento bimestral com o propósito de criar diálogos entre as várias faces do meio cinematográfico, trazendo para o público, sempre que possível, filmes, restaurações e eventos inéditos em sessões duplas.