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Sessão Mutual Films

Uma terceira criatura:
Filmes de Ruchir Joshi

A Sessão Mutual Films de setembro destaca a obra do cineasta, escritor e fotógrafo indiano Ruchir Joshi (que nasceu em Calcutá em 1960). Joshi chama seu cinema de “uma terceira criatura” – nem ficção, nem documentário tradicional, mas uma não ficção que trilha seu próprio caminho em diálogo com os trabalhos e pensamentos de outros artistas. Os programas que vão passar no IMS contam com três filmes do cineasta que foram rodados em 16 mm e lançados no início da década de 1990, e que serão apresentados em novas restaurações digitais. O longa-metragem Egaro Mile (Onze milhas) (1991) apresenta de forma discursiva os cantores folclóricos itinerantes no estado indiano de Bengala Ocidental, conhecidos como Bauls, cujo trabalho constitui uma tradição milenar. O curta-metragem Memórias da cidade do leite (1991) explora a cidade de Amedabade com um olhar poético, em parceria com o dramaturgo Madhu Rye, e, o filme-ensaio de média-metragem Contos do planeta Kolkata (1993) (feito em colaboração com o artista norte-americano Tony Cokes, entre outros) cria um jogo de espelhos entre a metrópole indiana do título e suas representações difamatórias na mídia ocidental. A sessão também inclui uma versão remasterizada do curto retrato da cidade de Bombaim Chegada (1980), do grande cineasta experimental indiano Mani Kaul, uma referência-chave para Joshi em sua busca cinematográfica por formas únicas.

 A Sessão Mutual Films tem curadoria de Aaron Cutler e Mariana Shellard.

Sessões especiais

Exibição de Egaro Mile (Onze milhas)
IMS Paulista, 20/9/2023, quarta, 19h
Sessão apresentada por Aaron Cutler e Mariana Shellard

Exibição de "Amedabade, Bombaim, Calcutá” (3 filmes, 74 min)
IMS Paulista, 21/9/2023, quinta, 20h
Sessão apresentada por Aaron Cutler e Mariana Shellard

Da esquerda para direita, cena de Onze milhas, Memórias da cidade do leite e Contos do planeta Kolkata, de Ruchir Joshi e Chegada, de Mani Kaul

Filmes


Egaro Mile (Onze milhas)

Programa 1

 

Egaro Mile (Onze milhas)
Egaro Mile
Ruchir Joshi | Índia | 1991, 160’, DCP (Arsenal) | Classificação indicativa: 14 anos

O único documentário de longa-metragem de Ruchir Joshi realizado até agora começa com uma dedicatória ao seu pai, o escritor Shivkumar Joshi, que morreu durante as filmagens e que estimulou seu filho a seguir uma vida nas artes. Segue-se, então, um intertítulo com uma velha história sobre um homem cuja barriga inchada produzia um som percussivo que espantava até os pássaros das árvores e cuja risada tornava-se uma canção. Assim, Ruchir faz a primeira descrição dos Bauls, artistas cujas presenças, obras e odisseias formam a matéria-prima de seu filme.

Egaro Mile foi filmado ao longo de três anos em diversos locais no estado de Bengala Ocidental, da aldeia de Aranghata ao coração de Calcutá. O título do filme (que conta com o subtítulo Um diário de jornadas) é o nome, inventado por um jovem Baul chamado Karthik Das, de um determinado lugar qualquer dado como ponto de partida para novas explorações. Como explica o pesquisador e músico bengalês Deepak Majumdar – que aparece de forma periódica navegando em uma canoa no rio Ganges –, os Bauls são “um grande grupo de pessoas espalhado por Bengala Ocidental, que carrega por mais de mil anos uma tradição de contar histórias relativas ao ser humano através de músicas, danças, performances, gestos, silêncios, olhares...”. Ele os insere dentro do contexto global da cultura itinerante e folclórica, ao lado dos trovadores e ciganos europeus, hobos americanos e rastafáris jamaicanos.

O filme apresenta lindas performances dos Bauls ao longo de três capítulos e um epílogo, cujas cenas seguem uma ordem não cronológica e frequentemente contam com cartelas que trazem as letras das músicas sobre buscas pessoais. No processo, diversos “homens do coração” (como os Bauls são descritos em certo momento) entram em foco, como o sensível Paban Das e o conflitante Gaur Khepa, que se conheceram na infância, viveram e tocaram juntos por muito tempo e se separaram alguns anos antes do começo das filmagens. Também aparecem Bauls mais veteranos, como as fortes e francas figuras maternas Ma Gosai e Mira Mahanta, o emotivo Subol Das (professor de Paban e Gaur) e o grande guru Haripada Goshai, que, de forma perspicaz, ironiza o potencial etnográfico do projeto de Ruchir, dizendo a ele: “Nós filmaremos vocês, em suas casas, como vocês estão filmando o nosso festival”.

O cineasta também coloca sua própria voz de narrador no filme, refletindo em diversos momentos sobre por onde começar e como explicar as vidas de seus protagonistas. Entramos em sua casa em Calcutá, observamos suas referências musicais, anotações, desenhos – os quais também aparecem nos intertítulos dos capítulos – e ouvimos as suas indagações sobre o que estamos assistindo, seja os Bauls ou um filme sobre eles. No processo, Ruchir situa os Bauls ao lado de artistas bengaleses, como o escritor Rabindranath Tagore e os cineastas Satyajit Ray e Ritwik Ghatak, assim como músicos e escritores americanos e europeus (Laurie Anderson, Bob Dylan, Michel Foucault, entre outros). Uma frase de T. S. Eliot, “e o fim de toda nossa exploração será chegar no ponto de partida”, sublinha a estrutura circular do filme, que serve como um inestimável registro histórico ao mesmo tempo que contempla sua razão de ser e método de execução.

Egaro Mile (Onze milhas) começou como uma produção independente em 1988 e foi finalizado com o apoio do Channel 4, no Reino Unido, em 1991, mesmo ano em que ele ganhou o prêmio Joris Ivens no festival Cinéma du Réel. O filme, junto aos outros dois filmes de Ruchir Joshi realizados no mesmo período, foi restaurado digitalmente entre 2017 e 2018 pelo Arsenal – Institut für Film und Videokunst e.V., em Berlim, a partir do negativo de câmera original em 16 mm e uma fita magnética em 16 mm da mixagem final do som. As exibições do filme no IMS marcam sua estreia brasileira.

 

 

PROGRAMAÇÃO

IMS Paulista
20/9/2023, quarta, 19h
Sessão apresentada por Aaron Cutler e Mariana Shellard

30/9/2023, sábado, 16h40


"Amedabade, Bombaim, Calcutá” (3 filmes, 74 min)

Programa 2

O programa de três filmes passa pelas ruas de três cidades indianas, cada uma com suas particularidades. E assim reflete um deslocamento feito pela família de Ruchir Joshi, cujos pais migraram de Amedabade, no estado de Gujarate, para Calcutá antes dele nascer. Em um texto escrito para o WdW Review em 2015, o cineasta e escritor lembra da viagem anual feita durante sua infância para o outro lado do país para visitar seus parentes gujaratis, com a cidade de Bombaim se inserindo no caminho: “Os contrastes entre Calcutá, Bombaim e Amedabade eram enormes. Calcutá era tropical, superpopulosa, decrépita, com a sensação de que em todo lugar coisas e sistemas quebravam... Bombaim era tropical, superpopulosa e assustadora: as coisas funcionavam, mas a um ritmo feroz e surreal... Amedabade, entretanto, parecia ser completamente desconectada das tensões que torturavam as duas cidades grandes. As pessoas eram relaxadas, calorosas e generosas, e até seu humor era gentil”.

Memórias da cidade do leite apresenta cenas de Amedabade (filmadas por Ruchir e Ranjan Palit), com texto e narração do dramaturgo gujarati Madhu Rye, que casa versos rimados de uma peça de rádio da década de 1960 com um texto autobiográfico. Inúmeras vacas nos guiam pelas ruas de uma cidade popular e simples, com aspecto pacato, enquanto ouvimos sobre um processo rápido de modernização e americanização que atinge os habitantes. Os rebanhos de animais compartilham as praças com bancas de comida de rua e um fluxo constante de motocicletas. Acompanhando os momentos lúdicos, há um tom sombrio que aponta para a história de violência e opressão na cidade contra a minoria muçulmana. Enquanto crianças, mulheres e homens brincam, comem e se divertem à noite, Rye fala de “Amedabade... Onde basta uma folha cair para incitar rebeliões religiosas”.

A Bombaim percorrida por Mani Kaul em Chegada é também uma cidade de contradições. Embora Kaul seja mais conhecido por dirigir obras-primas narrativas do movimento de Cinema Paralelo indiano, como Uski Roti (1970) e Duvidha (1973), ele também fez documentários majestosos, nos quais sua liberdade formal driblou as restrições da obra comissionada. As imagens de Chegada (embaladas pela trilha sonora do renomado compositor clássico indiano Raghunath Seth) descrevem, quase sem diálogos, a variedade dos trabalhos precários oferecidos aos mais pobres. Operários da construção civil sobem de chinelo, sem capacete, num elevador estruturado por finas toras de madeira. Trabalhadoras carregam bacias de pedras nas cabeças. Centenas de pessoas dormem no chão de uma estação de trem. As variedades das comidas são ao mesmo tempo produtos de labor e ocasiões para descanso de pessoas que olham para a câmera com expressões marcantes.

Em Contos do planeta Kolkata, Joshi (um artista influenciado por Kaul) coloca sua cidade nativa na tela com o intuito de questionar a maneira como o cinema e a mídia ocidentais a percebem – por exemplo, na exploração da miséria por Louis Malle no documentário Calcutá (Calcutta, 1969), parodiado pela interpretação de Ruchir de um cineasta francês em busca da “câmera impossível”, e na superficialidade hollywoodiana de A cidade da esperança (City of Joy, 1992), cujas filmagens com Patrick Swayze e um grande elenco são captadas ao lado das reações de habitantes de Calcutá, que não se reconhecem na história. O filme também apresenta outras narrativas possíveis, como em uma cena no qual o videoartista norte-americano Tony Cokes, cuja obra descontrói o racismo latente na mídia de seu país, aparece conduzindo um riquixá e encara o público para declarar que “parece haver uma indústria do medo do outro lado da câmera... Imagens familiares de Calcutá parecem existir para que o espectador ocidental se sinta mais confortável, mais humano e talvez até mais sortudo do que ele realmente é.” E há a vontade melancólica narrada por Ruchir de fazer um filme sobre a cidade com seu mentor Deepak Majumdar, um pesquisador e músico que morreu logo antes do começo do projeto a que estamos assistindo. A Calcutá do filme é uma e muitas cidades, aqui vista por alguém em busca de seu encantamento.

 

O programa conta com os seguintes filmes, todos em suas estreias brasileiras e nas melhores cópias de exibição:

Memórias da cidade do leite
Memories of Milk City
Ruchir Joshi | Índia | 1991, 14’, DCP (Arsenal) | Classificação indicativa: 14 anos

Chegada
Arrival
Mani Kaul | Índia | 1980, 20’, DCP (Ashish Rajadhyaksha + National Film Development Corporation of India) | Classificação indicativa: 14 anos

Contos do planeta Kolkata 
Tales from Planet Kolkata
Ruchir Joshi | Índia | 1993, 40’, DCP (Arsenal) | Classificação indicativa: 14 anos

 

 

PROGRAMAÇÃO

IMS Paulista
21/9/2023, quinta, 20h
Sessão apresentada por Aaron Cutler e Mariana Shellard

23/9/2023, sábado, 16h15


Programação

IMS PAULISTA

20/9/2023, quarta
19h - Egaro Mile (Onze milhas)
Sessão apresentada por Aaron Cutler e Mariana Shellard

21/9/2023, quinta
20h - "Amedabade, Bombaim, Calcutá” (3 filmes, 74 min)
Sessão apresentada por Aaron Cutler e Mariana Shellard

23/9/2023, sábado
16h15 - "Amedabade, Bombaim, Calcutá” (3 filmes, 74 min)

30/9/2023, sábado
16h40 - Egaro Mile (Onze milhas)


Ingressos

Vendas
Os ingressos do cinema podem ser adquiridos online ou na bilheteria do centro cultural, mais informações abaixo.

Meia-entrada
Com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública, estudantes, crianças de 3 a 12 anos, pessoas com deficiência, portadores de Identidade Jovem e maiores de 60 anos.

Cliente Itaú
Desconto de 50% para o titular ao comprar o ingresso com o cartão Itaú (crédito ou débito). Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala.

Devolução de ingressos
Em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos e por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site.


IMS Paulista

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Bilheteria: de terça a domingo, das 12h até o início da última sessão de cinema do dia, na Praça, no 5º andar.

Os ingressos para as sessões são vendidos na recepção do IMS Paulista e pelo site ingresso.com. A venda é mensal e os ingressos são liberados no primeiro dia de cada mês.

Não é permitido o consumo de bebidas e alimentos na sala de cinema.


Sessão Mutual Films

Sessão Mutual Films é um evento bimestral com o propósito de criar diálogos entre as várias faces do meio cinematográfico, trazendo para o público, sempre que possível, filmes, restaurações e eventos inéditos em sessões duplas.