Cronologia Marcel Gautherot
Nascido em Paris em 1910 e radicado no Rio de Janeiro desde fins de 1940, Gautherot dedicou seu olhar – no qual a sobriedade documental, marca de sua geração, fundia-se ao apurado senso estético de quem se formara como arquiteto de interiores na École Nationale Supérieure des Arts Décoratifs – a motivos tão variados quanto folclore, arquitetura, natureza e paisagem humana, em diversas regiões do país. Em todos esses campos, manteve um excepcional padrão de qualidade e uma rara consciência de “obra” – que, nos últimos anos de vida, levou-o a dedicar-se exclusivamente à organização de seu monumental arquivo.
1910: Em meio às comemorações pela passagem do dia 14 de julho, nasce em Paris, na rua Bonaparte, Marcel André Félix Gautherot.
1925: Com apenas 15 anos, ingressa no curso noturno de arquitetura da École Nationale Supérieure des Arts Décoratifs, em Paris e começa a trabalhar como auxiliar de arquiteto.
1929: Junto com Jacques Azema e outros alunos da École Nationale Supérieure des Arts Décoratifs de Paris, participa de concurso promovido pela empresa austríaca Thonet-Mundus para a criação de móveis e cadeiras.
1936
Participa de projetos ligados ao Museu de Etnografia do Trocadero (MET) e, posteriormente, da construção e instalação do Museu do Homem, no Palais Chaillot, na função de arquiteto de interiores, em conjunto com os arquitetos Robert Pontabry e Claude Laurens, sob a direção de Paul Rivet e Jacques Soustelle. Documentando as peças do museu, começa a dedicar-se à atividade da fotografia e desenvolve técnicas de laboratório.
Em meados de 36, após assistir ao filme Que Viva Mexico!, de Serguei Eisenstein, parte para o México com cartas de recomendação de Soustelle e do Museu do Homem. Realiza o registro fotográfico de objetos de arte pré-colombiana do Museu Nacional do México e fotografa na fazenda Tetlapayac, onde Eisenstein havia realizado seu filme. Conhece o fotógrafo mexicano Manuel Álvarez Bravo e sua mulher, Lola.
1937: Em Paris, frequenta o meio artístico e intelectual e faz amizade com Jacques Prévert, Pierre Verger e outros. É neste período que lê Jubiabá, de Jorge Amado (em francês Bahia de Tous les Saints), livro que desperta seu interesse pelo Brasil.
1938: Suas fotografias do México são publicadas nas revistas Cahiers d’Art, e na Voilà, no artigo La Race des Hommes Perdus. Ao ver as imagens da Cahiers d’Art, Picasso solicita aos editores da revista um conjunto de cópias das fotografias de Gautherot.
1939: Cativado pela leitura de Jorge Amado, parte para o Brasil, com a ideia de subir o Amazonas e concluir viagem no Rio de Janeiro, em pleno carnaval. Viaja pelo Recife, Belém e interior do Amapá. Entra na floresta rumo à foz do rio Paru, fotografando a Amazônia.
1940
Com o início da Segunda Guerra Mundial, Gautherot é mobilizado e embarca para Dakar, Senegal, onde serve o exército por apenas alguns meses, como desenhista da seção de engenharia. Com o primeiro armistício, é liberado e retorna ao Brasil ainda no final do ano. Estabelece-se definitivamente no Rio de Janeiro, onde logo aproxima-se dos artistas e intelectuais modernistas.
Apresenta-se no recém-criado SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, atual IPHAN), carregando consigo fotografias feitas na Grécia. Aproxima-se do arquiteto Lucio Costa e de Rodrigo Melo Franco de Andrade, diretor da instituição, para a qual começa a realizar trabalhos de documentação. O primeiro é no Rio Grande do Sul: além do registro fotográfico, colabora na disposição das peças do Museu das Missões, projetado por Lucio Costa.
1941/1946
Junto aos fotógrafos franceses Pierre Verger e Antoine Bon, fotografa as mais diversas regiões do Brasil: a arquitetura colonial e moderna do Rio de Janeiro, o Espírito Santo, imagens da vida rural no sul: colheitas de café (Itaquera/SP) e estâncias de gado (RS). Vai também à Bahia, ao Baixo São Francisco, Penedo (AL) e Pernambuco. O resultado é publicado no livro Brésil.
Fotografa, também para o SPHAN, as obras de Aleijadinho em Congonhas do Campo: os profetas e os Passos da Paixão, as capelas votivas antes e depois da redisposição das peças realizada sob a coordenação de Alcides Rocha Miranda e Lygia Martins Costa.
Conhece Carybé e hospeda-o, juntamente com Verger, em seu apartamento no Rio. Aproxima-se também nesse período de Oscar Niemeyer e de Roberto Burle Marx, ao fotografar o conjunto arquitetônico da Pampulha, em Belo Horizonte.
1947: Percorre do Recife ao Amazonas, sempre fotografando. Suas fotos das figuras de proas de barcos do São Francisco são publicadas na revista O Cruzeiro, contribuindo de maneira decisiva para a divulgação e valorização destas imagens, que a partir de então se tornariam definitivamente conhecidas como carrancas.
1948-50: Conhece Edison Carneiro, ativo militante do movimento folclorista, e aproxima-se do projeto de pesquisa e documentação da Comissão Nacional de Folclore, criada em 47. Registra aspectos do folclore nacional viajando por sua conta pelo Brasil, e como convidado para os encontros anuais conhecidos como Semanas do Folclore. Entre outros trabalhos, realiza abrangente ensaio do Bumba-meu-boi no Maranhão e do Reisado em Alagoas, das Cavalhadas, do Carnaval, do Círio de Nazaré, do Alardo e da festa dos Guerreiros.
1951: Jacques Prévert publica Spectacle pela editora Gallimard de Paris, no qual inclui o amigo Marcel Gautherot como autor da seguinte citação: “Au Brésil, j’ai voulu abattre toute une fôret pour faire le portrait du seul arbre que me plaisait”.
1957: Gautherot participa da exposição Danses et Théatre Populaires du Brésil, na Casa Sarah Bernhard, em Paris. É o principal fotógrafo da exposição de arte popular e folclore, apresentando fotos de temas como Bumba-meu–boi, a Procissão dos Navegantes e a do Senhor do Passos, guerreiros, caboclinhos, carrancas, festas, ritos tradicionais e igrejas da Bahia.
1958/1960: Grandes painéis fotográficos com imagens do Brasil assinadas por Marcel Gautherot integram o Pavilhão do Brasil na Exposição Internacional de Bruxelas.
Viaja diversas vezes a Brasília e realiza ampla cobertura fotográfica da construção da nova capital projetada por Lucio Costa e Oscar Niemeyer, por encomenda deste. Várias destas fotos são publicadas na revista Módulo, fundada e dirigida por Niemeyer.
1961: Por iniciativa de Edison Carneiro, é lançada, em setembro, a Revista Brasileira do Folclore, cujo primeiro número traz na capa uma foto do bumba-meu-boi maranhense assinada por Marcel Gautherot, que se tornaria colaborador assíduo da revista a partir de então. A Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro prevê ainda a edição de um álbum, não realizado, com suas imagens dos folguedos regionais.
1962: Continua fotografando intensamente Brasília após sua inauguração, em 1960. No total, reúne cerca de 7000 negativos, que compreendem o Catetinho, o Congresso Nacional, os Palácios da Alvorada, Itamaraty, Planalto e Justiça, o Teatro Nacional, a UnB, entre outras obras. Várias destas fotos integram exposição realizada no Grand Palais, em Paris.
Segue viajando pelo Brasil, realizando documentação fotográfica para a Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro, sob a direção de Edison Carneiro, trabalho que se encerraria somente com a morte deste, em 1972.
Documenta extensamente as obras de urbanização do Parque do Aterro do Flamengo, no Rio, projeto de Affonso Eduardo Reidy e Roberto Burle Marx, dirigido por Lota de Macedo Soares.
1965: Marcel Gautherot transfere seu laboratório fotográfico para um anexo do escritório de Burle Marx, em Laranjeiras, espaço que ocuparia até falecer.
1970/1972: Fotografa grande parte da coleção de arte popular brasileira de seu amigo e também designer francês Jacques Van de Beuque, coleção esta que constitui o acervo do atual Museu do Pontal, no Rio. Num estúdio improvisado dentro da própria galeria de exposições, realiza cerca de 600 fotos, principalmente de ex-votos.
1973: O Departamento de Cooperação Cultural e Divulgação do Ministério das Relações Exteriores encomenda a Gautherot 30 álbuns com 348 fotografias sobre temas culturais brasileiros, para serem distribuídos às principais embaixadas brasileiras. As fotos são escolhidas do seu arquivo pelo embaixador Wladimir Murtinho.
1979: Fotografias de Marcel Gautherot integram a grande exposição retrospectiva de Oscar Niemeyer realizada no Centro Georges Pompidou, em Paris, e depois levada para Florença (Igreja de Santa Croce), Veneza (Palazzo Grassi) e Lugano.
1986
O Cônsul Geral da França no Rio de Janeiro, André Cira, indica Marcel Gautherot para receber o Grau de Cavaleiro da Ordem das Artes e das Letras, ressaltando sua contribuição para a irradiação da cultura francesa. No mesmo ano, Marcel Gautherot e Pierre Verger recebem, pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro, o Prêmio Golfinho de Ouro na categoria Fotografia.
Gautherot passa a dedicar-se exclusivamente à organização do seu arquivo fotográfico.
1987: Marcel Gautherot recebe a medalha comemorativa Rodrigo M. F. de Andrade (SPHAN 1937 – 1987) da Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
1995: É inaugurada sua primeira exposição individual, na Casa França-Brasil, no Rio, com lançamento simultâneo do livro Bahia: Rio São Francisco, Recôncavo e Salvador, com apresentação e notas de Lélia Coelho Frota.
1996: Em 8 de outubro, Marcel Gautherot falece no Rio de Janeiro.
1999: O acervo fotográfico de Marcel Gautherot, composto por cerca de 25 mil imagens, entre negativos, positivos e folhas de contato, é adquirido pelo Instituto Moreira Salles.
2001: O IMS publica o livro O Brasil de Marcel Gautherot e abre exposição de mesmo nome em sua sede no Rio de Janeiro.
2007: O Museu de Arte Brasileira, da FAAP, inaugura a exposição O olho fotográfico - Marcel Gautherot e seu tempo, fruto de extensa investigação das pesquisadoras Heliana Angotti-Salgueiro e Lygia Segala. Acompanha a exposição um abrangente livro de mesmo nome.
2009: Com organização de Samuel Titan Jr. e de Milton Hatoum, o IMS publica o livro Norte e abre exposição em sua sede de São Paulo com fotografias feitas por Gautherot na Amazônia e no Pará.
2010: Em comemoração aos 50 anos da inauguração da capital, o IMS publica Brasília, de Marcel Gautherot e abre a exposição As construções de Brasília, com fotografias de Gautherot, Thomaz Farkas e Peter Scheier e curadoria de Heloisa Espada.
2013: É inaugurada no Museum für Fotografie, em Berlim, a exposição Brasiliens Moderne, com curadoria de Samuel Titan Jr. e Ludger Derenthal, e fotografias de Marcel Gautherot, José Medeiros, Thomaz Farkas e Hans Gunter Flieg. A exposição segue para a Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, para a Fondation Calouste Gulbenkian, em Paris, e para o Círculo de Belas-Artes de Madri. Por fim, com o título de Modernidades fotográficas, 1940-1964, ocupa durante um ano a Galeria Marc Ferrez, no IMS do Rio de Janeiro. Acompanha a exposição um catálogo de mesmo nome, publicado em três edições: alemão, francês e português.
2016: A Maison Européenne de la Photographie inaugura em Paris a primeira exposição individual retrospectiva dedicada a Marcel Gautherot em sua cidade natal, Marcel Gautherot - Brésil, Tradition, Invention. Com curadoria de Sergio Burgi e Samuel Titan Jr., a exposição ocupa o primeiro andar da MEP. Na mesma ocasião, são lançadas quatro edições do catálogo Marcel Gautherot - fotografias: em português, em francês, em inglês e em alemão.