TEXTO CURATORIAL
Pega a visão, se liga no procedimento! A periferia tem muita habilidade em formar diálogos coletivos, são códigos de condutas baseados no papo reto e na sinceridade da troca de saberes, que refletem no ritmo de vida dos territórios.
Neste ressoar dos conhecimentos, é urgente escutar artistas, pensadores, comunicadores e produtores vindo da periferia. Na verdade é escutar o centro, é estar no olho do furacão. A dança que mais se dança no Rio de Janeiro hoje vem da periferia, a música que mais se escuta, o de mais inovador nas artes visuais, audiovisual e performance, também.
No Escuta Festival 2021 o foco é a conversa entre artistas, para artistas, mas também um convite às instituições, aos curadores e para toda a cadeia de produção a perceber as possibilidades de colaborações, demandas e sobre os processos que mantiveram esses artistas de pé durante o caos que se instalou na cena cultural carioca nos últimos anos.
O evento deste ano traz para o ambiente virtual do Instituto Moreira Salles um novo formato: um corpo curatorial, composto por artistas da cena urbana, favelada ou periférica, equipes de produção e de comunicação, além de artistas performers da metrópole fluminense. São corpos políticos, não hegemônicos, dissidentes e plurais atuantes nos espaços artísticos, nas ruas e encruzilhadas da cidade. Construíram os seus repertórios nas resistências do fazer, no relacionar e no aprendizado coletivo. Traduzem uma potência transformadora para a arte contemporânea brasileira.
Será uma constelação complexa e reunirá produções audiovisuais, shows, performances, ações nos territórios, como também em espaços virtuais parceiros, como a TV Coragem. Ao longo dos três dias, o público poderá acompanhar e se relacionar com linguagens artísticas que despertam a apreciação e as reflexões sobre os espaços de arte, as relações com os territórios em suas diversas expansões, os desafios de acessos à vida virtual e sobre como se posicionar profissionalmente num mundo pós pandêmico. A necessidade de ouvir os outros, que também são parte de nós, por coexistirem em um constante ciclo de resistência, se faz presente.
O Festival celebra a comunhão das diferenças culturais em que agentes sociais e artistas ativistas mostram seus instrumentos de transformação e formas de manutenção de sonhos, nas comunidades. Além das linhas imaginárias do espaço urbano e das fronteiras chamadas de periféricas.
Misturando temporalidades e linguagens, evitando distopias e propondo alternativas utópicas, a programação trará temas como as relações entre micro e macropolítica, a ancestralidade, a intergeracionalidade, as reinvenções do espaço, a interdisciplinaridade entre linguagens e conteúdos, o futurismo que revisita tecnologias ancestrais, a infância, as tecnologias, a expansão do mundo físico pela possibilidade do virtual e as pulsões vigorosas e expansões criativas nos campos da música, da fotografia, do audiovisual, da literatura e da performance periféricos.
Permeadas pelo sentimento de honra e homenagem aos artistas que fizeram história e emanam inspirações, mesmo após sua passagem por este mundo, como seres encantados. O Escuta deve ser, por isso, parte de um acervo vivo das memórias artísticas contemporâneas, dos centros e das periferias. Escutar a periferia é escutar a massa, o tambor que dá ritmo ao coração da cidade.