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Samuel Titan Jr.
Sergio Burgi
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A exposição Marcel Gautherot – Brasil: tradição, invenção é a maior mostra das obras do fotógrafo francês já exibida no Brasil. Com curadoria de Sergio Burgi, coordenador de fotografia do IMS, e Samuel Titan Jr., coordenador executivo cultural do IMS, a exposição fica em cartaz no Paço Imperial, no Rio de Janeiro, de 14 de junho a 20 de agosto de 2017. A mostra revela a profundidade com que Gautherot documentou as especificidades geográficas e culturais brasileiras.
As fotografias fazem parte do acervo do IMS e a realização da exposição é uma parceria com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), por meio do Centro Cultural Paço Imperial. A exposição apresenta mais de 300 imagens, representativas de diversidade temática e da qualidade estética desenvolvida por Gautherot ao longo de sua carreira no Brasil.
Esta exposição retrospectiva de Marcel Gautherot, realizada durante as comemorações dos 80 anos do IPHAN no Paço Imperial do Rio de Janeiro, edifício símbolo da luta pela preservação do patrimônio brasileiro, constitui importante homenagem ao seu profundo legado no campo da fotografia, promovendo, simultaneamente, o reencontro de sua obra com as origens e os protagonistas deste projeto patrimonial tão essencial para o país e sua cultura.
Marcel Gautherot (1910-1996), fotógrafo francês que viveu a maior parte de sua vida no Brasil, produziu extensa documentação fotográfica sobre o país. Viajando por todo o território brasileiro, construiu uma obra de extraordinária qualidade estética nos dois domínios que privilegiou − a fotografia etnográfica e a fotografia de arquitetura.
Parisiense, filho de pai operário e mãe costureira, aos quinze anos ingressou no curso noturno da École Nationale Supériore des Arts Décoratifs, começando a trabalhar com design e arquitetura de interiores. Na década de 1930, atuou como arquiteto e fotógrafo no Museu do Homem, em Paris. Conviveu e colaborou com os integrantes da agência fotográfica Alliance Photo, como René Zuber, Emeric Feher, Pierre Boucher e Pierre Verger. Em 1936, viajou a serviço do museu para o México e, em 1939, para a região norte do Brasil (Amazônia e Pará). Com a eclosão da guerra na Europa, serviu o exército francês em Dacar e, depois do armistício, retornou ao Brasil, estabelecendo-se em definitivo como fotógrafo no Rio de Janeiro.
Na então capital do país, Gautherot logo formou um círculo de relacionamentos que lhe permitiu inserir-se rapidamente num meio de intelectuais e artistas semelhante ao que frequentara na década anterior na França. Nomes como Rodrigo Melo Franco de Andrade, Carlos Drummond de Andrade e Lucio Costa - reunidos no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan), criado em 1937, vinculavam a preservação do patrimônio colonial brasileiro à consolidação da arquitetura moderna no Brasil e à construção de uma nova identidade nacional. Junto a colaboradores como o escritor Mário de Andrade, estavam alinhados com a ideia de uma nova política de patrimônio, que intencionava se integrar à reflexão sobre a história da cultura brasileira.
A formação de Marcel Gautherot como arquiteto decorador e sua experiência museográfica levaram Lucio Costa a incumbi-lo, ainda no início dos anos 1940, de organizar o acervo e a exposição permanente de estatuária do recém-constituído Museu das Missões, no Rio Grande do Sul. A partir de então Gautherot tornou-se um colaborador permanente do Sphan e percorreu todo o país fotografando edifícios históricos, festas populares, danças, artesanato e atividades folclóricas de diversos estados brasileiros, principalmente da região Nordeste. Estes trabalhos o levaram também a atuar junto à Comissão Nacional do Folcore (criada em 1947) e à Campanha de Defesa do Folclore Nacional (lançada em 1958), ambas capitaneadas pelo historiador Edison Carneiro.
Ao mesmo tempo, tornava-se o principal fotógrafo da arquitetura moderna no país, dedicando-se em especial ao registro dos grandes projetos de Oscar Niemeyer, como o conjunto arquitetônico da Pampulha e a construção de Brasília. Com Niemeyer manteve uma estreita e duradoura amizade e colaboração, marcada por afinidades estéticas e políticas, em uma relação muito semelhante à colaboração do fotógrafo Lucien Hervé com Le Corbusier. Com Burle Marx Gautherot estabeleceria uma colaboração igualmente de décadas, registrando extensivamente as principais obras do grande mestre do paisagismo brasileiro.
A obra de Gautherot desempenhou um papel fundamental na construção de um imaginário brasileiro. Seu grande projeto documental - realizado ao longo de mais de cinqüenta anos de atividade no Brasil até o seu falecimento no Rio de Janeiro em 1996 e cristalizado em imagens icônicas que integram seu acervo de mais de 25.000 fotografias, hoje preservadas no Instituto Moreira Salles - mapeou, documentou e interpretou a trama de território, tradição e invenção que deu forma ao Brasil moderno.
Teaser da fala de Jacques Leenhardt sobre a obra de Marcel Gautherot
A obra do fotógrafo Marcel Gautherot (1910-1996), que ganha sua primeira retrospectiva no Brasil, no Paço Imperial, Rio de Janeiro, é assunto deste depoimento do crítico de arte e pesquisador francês Jacques Leenhardt.
Marcel Gautherot - Brasil: tradição, invenção
Vídeo que integra a exposição em cartaz no Paço Imperial, no Rio de Janeiro, de 13 de junho, a partir das 18h30, a 20 de agosto de 2017.
Gautherot na MEP
A exposição Marcel Gautherot – Brasil: tradição, invenção ficou em cartaz na Maison Européenne de la Photographie (MEP), em Paris, cidade onde o fotógrafo nasceu, de 15 de junho a 28 de agosto de 2016. Ao término de dez dias de trabalho em Paris acompanhando a montagem da exposição, a curadora-assistente Mariana Newlands gravou em vídeo um passeio pelas galerias ocupadas pelo trabalho do fotógrafo, momentos antes da abertura do evento ao público.
Amazônia
Na sua primeira passagem pelo Brasil, em 1939, ainda a serviço do Museu do Homem, Marcel Gautherot se embrenhou pela Amazônia. A mata impenetrável e o conflito visual causados pelo encontro das águas com a floresta virgem foram um desafio para o fotógrafo, que voltaria à região inúmeras vezes. Para ultrapassar a densa barreira vegetal − e também visual −, Gautherot penetrou na floresta pelos igapós, deixando-se envolver por folhas, cipós, ondulacões e reflexos, num jogo quase abstrato de luz e sombra. A figura humana aparece, quase sempre, sutilmente inserida nesse universo, do morador ribeirinho e o pescador aos índios assurini em seu primeiro contato com o mundo exterior.
Dialogando com o movimento construtivo e até mesmo com o concretismo brasileiro, as imagens não deixam de cultivar uma certa paciência do olhar, uma espera calada e um profundo vínculo com o mundo sensível e humano que convive com a paisagem. Sua extensa documentacão registra as moradias ribeirinhas (palafitas), os mercados flutuantes, o transporte de produtos e pessoas em pequenas embarcacões, símbolos da vida ribeirinha dos habitantes da floresta e dos moradores da periferia de Manaus, capital do estado do Amazonas.
Aquiraz e ver-o-peso
A afirmação de Le Corbusier de que “a arquitetura é o jogo sagaz, correto e magnífico dos volumes reunidos sob a luz”, bem como seu entendimento da “luz como base da arquitetura”, certamente tornaram-se conceitos fundamentais para Marcel Gautherot nos seus anos de formação como arquiteto e como fotógrafo na Paris dos anos 1930. A luz e sua interpretação, como elementos modeladores e estruturantes das decisões formais e estéticas, tanto na arquitetura como na fotografia, acompanhariam, portanto, Gautherot ao longo de toda a sua carreira.
No Brasil, Gautherot afirmaria que "fotografia é arquitetura”, e que uma pessoa que não entendesse de arquitetura dificilmente seria capaz de realizar uma boa fotografia. Duas séries produzidas por Gautherot no Norte e Nordeste brasileiro, uma no mercado Ver-o-Peso, em Belém do Pará, outra na praia de Aquiraz, na costa do estado do Ceará, evidenciam sua vinculação profunda com os conceitos descritos acima. Nessas séries, a luz da costa brasileira e os elementos geométricos das velas das embarcações conduzem o próprio trabalho de documentação, associando elementos formais e geométricos a uma fotografia que é também de forte viés humanista. Gautherot registra os trabalhadores em suas atividades diárias, no mercado Ver-o-Peso e na pesca em alto-mar dos jangadeiros de Aquiraz, em imagens conscientemente estruturadas dentro do campo de enquadramento de sua Rolleiflex.
É, portanto, esta consciência clara de Gautherot – da forma como elemento estruturante da narrativa em seus extensos projetos documentais – que caracteriza sua carreira de cinco décadas no Brasil, e o que, em última instância, estabelece a unidade entre seus trabalhos de vertente etnográfica e os de documentação da arquitetura moderna.
Arquitetura e paisagismo
A chegada de Marcel Gautherot ao Rio de Janeiro coincidiu com o melhor momento da arquitetura moderna no Brasil. A partir da década de 1940, Oscar Niemeyer, Lucio Costa, Roberto Burle Marx, Affonso Eduardo Reidy e Olavo Redig de Campos entre outros, deram início a um movimento de renovação criativa que logo se faria sentir na paisagem urbana — o exemplo emblemático era a sede do Ministério da Educação e Saúde Pública, no Rio de Janeiro, que teve Le Corbusier como consultor – e que culminaria com a construção de Brasília, inaugurada em 1960. Gautherot logo criou laços de amizade e de trabalho com toda essa geração, fotografando projetos como o Conjunto Arquitetônico da Pampulha de Niemeyer, o Museu de Arte Moderna de Reidy ou os jardins de Burle Marx. Foi por meio de Niemeyer e de Lucio Costa que Gautherot pôde, anos mais tarde, gozar de livre acesso a todos os estágios da construção de Brasília, quando realizou seu mais vasto projeto de documentação arquitetônica.
Gautherot estampou inúmeras fotografias na revista Módulo, editada por Niemeyer, e muitos de seus registros das obras do arquiteto tiveram grande difusão em periódicos internacionais de arquitetura. Suas fotografias também estamparam as principais publicações internacionais sobre arquitetura moderna e paisagismo no Brasil editadas nos anos 1940 e 1950 e fizeram parte de importantes exposições. Em setembro de 1962, 90 fotografias de Gautherot e de Michel Aertsens integraram uma exposição itinerante de arquitetura brasileira organizada pelo Ministério das Relações Exteriores, que passaria por várias capitais da Europa. Em 1979, a grande exposição retrospectiva de Oscar Niemeyer realizada no Centro Georges Pompidou, em Paris, foi ilustrada com suas fotos.
Bahia
Publicado na França em 1938, com o título Bahia de tous-les-saints, o romance Jubiabá, de Jorge Amado, despertou o interesse de Marcel Gautherot pelo Brasil. O retrato do cotidiano da Bahia, presente em toda a obra de Amado, encantou o fotógrafo francês que realizou o mais denso registro visual da Bahia nas décadas de 1940 a 1960. O Rio São Francisco, o Recôncavo Baiano e a cidade de Salvador foram intensamente fotografados por Gautherot.
Considerada por muitos uma síntese da cultura brasileira, a Bahia revela traços marcantes da história da colonização portuguesa de caráter extrativista, caracterizada pelo regime de escravidão africana. Essas marcas do passado colonial e escravocrata distribuíam-se da costa ao interior, dos saveiros, do casario e das festas religiosas sincréticas da cidade de Salvador à romaria de Bom Jesus da Lapa, no rio São Francisco, e a suas tradicionais embarcações de transporte fluvial, protegidas por excepcionais figuras de proa – as carrancas.
Gautherot compreendeu que o processo de modernização do Brasil no período pós-guerra iria alterar profundamente a economia e a cultura do país. E foi na Bahia que ele produziu o registro territorial e cultural mais abrangente desse momento que precede a entrada do Brasil numa modernidade tardia e desigual, baseada na industrialização e na urbanização dos grandes centros do Sul e Sudeste, e na ocupação do Centro-Oeste, com a construção de Brasília.
O barroco mineiro
Quando a cidade de Ouro Preto, em Minas Gerais, foi elevada à categoria de Monumento Nacional, em 1933, o valor simbólico do barroco mineiro na construção da identidade nacional brasileira passou a ser reconhecido. Este feito foi um dos principais propulsores da criação, quatro anos depois, do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan), com sede no Rio de Janeiro. Marcel Gautherot passa a colaborar com o órgão logo depois de se estabelecer no Brasil, em 1940, e se identificou integralmente com os ideiais do grupo que então se esforçava para repensar o patrimônio do país.
A partir do trabalho no Museu das Missões, que realizou a partir de convite de Lúcio Costa, Gautherot tornou-se um colaborador permanente do Sphan e dedicou-se em especial à documentação do barroco mineiro. Dentre essas séries destaca-se o registro minucioso da obra de Aleijadinho, em Congonhas, onde estão suas esculturas mais marcantes: os profetas do santuário de Bom Jesus de Matosinhos.
Cultura popular
Durante toda sua carreira, Marcel Gautherot percorreu diversos estados brasileiros, principalmente no Nordeste, para registrar festas populares, danças, artesanato e atividades folclóricas. Os trabalhos que realizou para o Sphan o levaram naturalmente a atuar junto à Comissão Nacional do Folcore (criada em 1947) e à Campanha de Defesa do Folclore Nacional (lançada em 1958), ambas capitaneadas pelo historiador Edison Carneiro. Com os anos, produziu um acervo documental riquíssimo, com destaque para as séries extensas sobre o bumba meu boi do Maranhão e a Festa do Guerreiro de Alagoas.
Em mãos pouco hábeis, o tema seria um convite à foto posada, rígida, apta a revelar detalhes objetivos de vestimentas, adereços, instrumentos — e pouco mais. Fiel ao que aprendera no Museu do Homem, Gautherot não descuidava de nada disso, e suas imagens são fonte de muita informação preciosa. Mas o que salta à vista é seu caráter dinâmico, quase narrativo, voltado para a festa como ação.
O engajamento de Gautherot com a cultura popular remonta a seus anos de formação na França, em especial aos anos em que a Frente Popular chegou ao poder, como indica Michel Frizot no texto do catálogo que acompanha esta exposição. A chegada da esquerda socialista ao poder, entre 1936 e 1938, e as medidas com viés humanista, como as férias remuneradas e a redução da jornada de trabalho, influenciaram o grupo ligado ao Museu do Homem, do qual Gautherot fazia parte. Esse contexto certamente influenciou sua formação como fotógrafo documentarista e etnográfico, que atingirá sua maturidade nos trabalhos sobre a cultura popular.
México
Marcel Gautherot declarou em uma entrevista que a fotografia surgiu, antes de tudo, do seu desejo de viajar. No final da década de 1930 ele partiu para uma visita ao México a serviço do Museu do Homem. O país era um dos destinos que mais atraíam a atenção de intelectuais, artistas e fotógrafos franceses, como Henri Cartier-Bresson, André Breton e Pierre Verger. Gautherot fotografou as diversas regiões e culturas do país, onde permaneceu até o início de 1937.
Durante sua estada, fotografou objetos e artefatos pré-colombianos, além de registrar o trabalho e a vida da população mexicana, e também visitou a fazenda onde Sergei Eisenstein filmava Que Viva México!. As imagens que produziu no México receberam significativa atenção na França e na Europa, e muitas de suas fotografias foram incluídas em diversas publicações do final dos anos 1930.
Na viagem, conheceu Manuel Álvarez Bravo, que se tornaria um de seus fotógrafos de referência. A relação de Gautherot com a luz mexicana − tão presente na obra de Álvarez Bravo −, ecoará nos trabalhos do fotógrafo francês de documentação dos lugarejos do interior e da costa brasileira.
Em 1999, o acervo fotográfico de Marcel Gautherot, composto por cerca de 25 mil imagens, entre negativos, positivos e folhas de contato, é adquirido pelo Instituto Moreira Salles.
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