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Na voz de Sérgio

14 de maio de 2020
O escritor Sérgio Sant’Anna em seu apartamento em Laranjeiras, no Rio de Janeiro, em 2012 (Foto de Bel Pedrosa)

As últimas semanas têm sido especialmente trágicas para a cultura brasileira, com o país perdendo artistas fundamentais em diversas áreas. Entre outros, partiram na música Moraes Moreira e Aldir Blanc, Flávio Migliaccio nas artes dramáticas e Abraham Palatinik nas artes plásticas e, na literatura, Rubem Fonseca e Sérgio Sant'Anna, um dos grandes inovadores da ficção brasileira contemporânea, ainda em plena atividade e no auge da forma aos 78 anos, quando morreu no Rio de Janeiro em decorrência da Covid-19.

Em outubro de 2000, Sérgio Sant'Anna participou do projeto O escritor por ele mesmo, promovido pelo Instituto Moreira Salles de 1997 a 2004. Eram encontros do público com os autores, que entre leituras de seus livros conversavam abertamente sobre sua obra e seu processo criativo. Além de Sérgio, 34 outros autores participaram do projeto, dentre eles João Gilberto Noll, Lygia Fagundes Telles, José J. Veiga, Adélia Prado e José Paulo Paes. O escritor por ele mesmo não se limitava a esses encontros presenciais: incluía também gravações em áudio, registradas em estúdio e depois reproduzidas em fitas cassete e CDs, sempre acompanhados por um folder biográfico.

Na primeira faixa de sua gravação, que hoje integra o acervo do IMS, Sérgio lê "A mulher-cobra", um de seus contos mais conhecidos, publicado originalmente no livro A senhorita Simpson, de 1989.

"A mulher-cobra", por Sérgio Sant'Anna

 

"O homem é o animal mais desgraçado e provocador de desgraças sobre a face da terra e outras faces porventura existentes", diz o narrador, que pode ser ouvido na voz eternizada do autor no áudio acima. "Só existem duas coisas grandiosas saídas do ser humano: a música e a imaginação, a capacidade de criar realidades que não são - mas se tornam - reais".

E é o que temos, e o que sempre teremos enquanto ainda houver mundo: a voz musical da imaginação, às vezes dentro de nossas cabeças, às vezes reverberando pelo ar na voz dos mestres generosos que se foram.

Daniel Pellizzari, editor, tradutor literário e escritor, faz parte da coordenadoria de internet do IMS.