Fotografia e literatura
Nos livros de Maureen Bisilliat
O cão sem plumas
Poema de João Cabral de Melo Neto
Nova Fronteira, 1984
Terminado o projeto dos Sertões, Bisilliat propôs ao editor da Nova Fronteira, Pedro Paulo de Sena Madureira, um livro com fotos suas sobre O cão sem plumas, um dos grandes poemas do pernambucano João Cabral de Melo Neto. As imagens haviam sido feitas para uma reportagem da revista Realidade, com texto de Audálio Dantas, sobre a região de Livramento, na Paraíba, onde homens e mulheres viviam da caça ao caranguejo. O ensaio de Bisilliat, que entrou na lama do rio e acompanhou com sua câmera as mulheres “caranguejeiras”, foi capa da edição de março de 1970. A matéria fora uma sugestão dela e de Dantas, que tiveram a ideia após assistir ao filme Os homens do caranguejo (1968), de Ipojuca Pontes.
Associar esse ensaio ao poema do pernambucano, escrito originalmente em 1950, caía como uma luva, pois, para ela, “João Cabral tem a mesma dureza passional de Drummond, mas é diferente, pois é mais político, no sentido social”. Logo no começo, versos como “[O rio] Sabia dos caranguejos/ de lodo e ferrugem./ Sabia da lama/ como de uma mucosa./ Devia saber dos polvos./ Sabia seguramente/ da mulher febril que habita as ostras” atestam que o casamento é perfeito. As imagens das caranguejeiras são em preto e branco, reforçando visualmente a ideia de que elas e a lama do rio se tornam uma coisa só. Os homens aparecem em algumas poucas fotos, em cores, na parte final do livro.
“Para o João Cabral, o ‘cão sem plumas’ era o Capibaribe, em Pernambuco; para mim, é esse rio em Livramento, na Paraíba.” Com essa frase simples, a fotógrafa resume a operação que faz nesta e em muitas de suas “equivalências”: une um universo seu, complementar, ao do texto literário, e esse contato potencializa ambos.
O livro seria parte de uma coleção da Nova Fronteira, dirigida por Bisilliat e intitulada Poemas do País, cuja proposta era “um traçado de equivalências, onde texto e imagem se justapõem, por consonância ou dissonância se agregam, e se encontram em equidistância de voo”. Numa entrevista ao Jornal do Brasil por ocasião do lançamento, a fotógrafa disse que previa publicar, nos volumes seguintes, Jorge de Lima, Mário de Andrade e Sousândrade: “Acho que tenho material para três ou quatro poemas. Depois disso nada exclui que se busque dentro de trabalhos de outros fotógrafos, especialmente aqueles que trabalhem dentro dessa realidade mais telúrica, a música de outros poemas”. Mas a coleção, cuja ideia faz lembrar a famosa Palabra e Imagen, publicada a partir dos anos 1960 pela espanhola Lumen, infelizmente não foi adiante.
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